Imposto do pecado

Prevista na reforma tributária, tributo sobre álcool ganha destaque

Alexandre Fonseca e Larissa Durães
amfjornalista@gmail.com e larissa.duraes@funorte.edu.br
Publicado em 26/04/2024 às 19:00.
Em 2018, o consumo de álcool resultou em despesas federais de tratamento do câncer da ordem de R$ 81,51 milhões, conforme revelado por uma pesquisa conduzida pelo INCA em 2022 (PIXABAY)

Em 2018, o consumo de álcool resultou em despesas federais de tratamento do câncer da ordem de R$ 81,51 milhões, conforme revelado por uma pesquisa conduzida pelo INCA em 2022 (PIXABAY)

Aprovada em 2023 pela Câmara dos Deputados, a reforma tributária brasileira inclui a instituição do Imposto Seletivo, que visa tributar produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente. Conhecido como “Imposto do Pecado”, esse tributo terá um impacto direto sobre bebidas alcoólicas e cigarros. 

A medida foi bem recebida pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA), que emitiu uma nota apoiando as medidas de taxação sobre os produtos com risco cancerígeno. Para o órgão, “esse marco na legislação tributária pode ser uma oportunidade para avançar no enfrentamento ao consumo de bebidas alcoólicas, que gera elevados custos econômicos, sociais e à saúde da população brasileira”. Ainda conforme o INCA, o consumo de bebidas alcoólicas vem aumentando nos últimos anos na população brasileira. No período de 2013 a 2019, dobrou em homens e aumentou em quatro vezes entre mulheres que dependem exclusivamente do SUS. Em 2019, 9 em cada 10 brasileiros referiram consumir bebidas alcoólicas.

Para a médica oncologista, Raiana Barbosa Chaves, o álcool está diretamente relacionado ao câncer. “O aumento do consumo de álcool está correlacionado com um maior risco de cânceres, abrangendo desde cabeça-pescoço até mama”, diz.

Um estudo realizado pelo INCA em 2022 revelou que o consumo de álcool contribuiu com R$ 81,51 milhões nos gastos federais com tratamento de câncer em 2018. A médica defende essa implemen-tação de medidas preventivas, incluindo uma tributação mais alta sobre bebidas alcoólicas. “No entanto, o aumento de impostos é apenas uma parte da solução. Para uma redução eficaz do consumo de álcool e, por consequência, dos casos de câncer relacionados, são necessárias campanhas educativas e outras medidas preventivas”, acredita.

Além disso, a médica destaca a importância da conscientização, especialmente entre os jovens, sobre os riscos à saúde associados ao consumo de álcool. Para ela, é fundamental que os jovens considerem seriamente suas escolhas de estilo de vida e compreendam os impactos negativos do consumo de álcool a longo prazo. “Não existe uma quantidade certa ou errada. Porque nenhuma dose de álcool é segura para a prevenção do câncer. Qualquer copo, qualquer gole, pode progredir para um câncer”, explica a médica.
 
SENSIBILIDADE DE PREÇO
Segundo o economista Aroldo Rodrigues, a proposta original da reforma visa simplificar o sistema de arrecadação de impostos no Brasil, unificando diversas alíquotas em uma única taxa de imposto — incluindo nesta dinâmica o “Imposto do Pecado”. Entretanto, a mesma abre precedentes para outros questionamentos, “para quem vai dizer o que ‘é sagrado, que é profano’. Então, daqui a pouco, a gente pode ter aí um aumento de carga tributária sobre refrigerante, por exemplo, sobre chocolate, sobre vários outros itens que alguém pode dizer que isso é ruim, é prejudicial. Isso abre um precedente muito complicado que, no final das contas, isso aí está embalando uma necessidade que o governo tem de aumentar a arrecadação e infelizmente aqui não tem nenhuma análise política” analisa o economista.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a carga tributária sobre o vinho é de cerca de 44% (nacional) e de 58% (importados). Vodca e uísque: 67% e cachaça: quase 82%. 

Para o produtor de cachaça em Salinas, Norte de Minas, Eilton Santiago, o impacto deste imposto pode ser entre 30% ou até 40% na produção. “Hoje, a gente já está tendo dificuldade de produzir, então eu acho que esse impacto vai influenciar tanto na produção, como vai cair o número de empregos também, isso a gente pode ter certeza, porque já está ruim e vai piorar ainda mais se tiver este imposto seletivo”, acredita o produtor. 

Apesar do lado positivo da mudança, Rodrigues também analisa que essas medidas ainda precisam ser discutidas, considerando fatores sociais. “É o mais pobre que vai ser prejudicado com isso. Quem tem uma renda maior, se determinado produto está R$ 10, amanhã está R$ 12, não mudará. Não mudará a vida dessa pessoa, ela continuará consumindo mesmo tanto. Na economia, a gente chama isso de sensibilidade de preço da demanda. Quem tem dinheiro não é sensível a preço. Está em R$ 12, eu consumia três e continuo consumindo três. Agora, a pessoa que tem menos renda, que tem menos capacidade de compra, se está em R$ 10, ela consome, se está em R$ 12, já não dá para ela consumir. Isso é realidade de muitos brasileiros”, finaliza.

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