Lívia Bacelete
Colaboração
Ô de casa, ô de fora e mais quem nessa casa mora. Aqui mora é Jesus Cristo, filho de Nossa Senhora”. O canto dos foliões e o som dos instrumentos ecoam nas casas da Comunidade de Sambaíba, no município de Januária, Norte de Minas Gerais. Os moradores da comunidade já sabem que é o canto do Terno de Reis da família de Seu Francisco Barbosa Santiago, grupo que realiza a Folia em louvor aos Santos Reis há mais de 40 anos na Comunidade.
HISTÓRIA
A Folia de Reis é um festejo religioso de origem portuguesa ligado às comemorações do culto católico do Natal. A data 06 de janeiro foi adotada para a passagem bíblica em que Jesus é visitado pelos três reis magos, Melchior, Baltazar e Gaspar. Na cultura popular brasileira, esta data é festejada com a visitação das casas por grupos organizados, conhecidos como Ternos ou Folias de Reis. Eles tocam instrumentos, cantam e, em alguns casos, dançam e encenam figuras folclóricas devidamente caracterizadas segundo as lendas e tradições locais. A Folia é comemorada em pequenas cidades do interior do Nordeste, Minas Gerais e São Paulo, e sobrevive nas periferias de grandes capitais.
ENCONTRO
As Folias de Reis começam no final de dezembro, após o Natal, e festejam até o dia de Reis, visitando casas, cantando e arrecadando doações, em sua maioria para motivos sociais e filantrópicos. Neste ano na Comunidade de Sambaíba, a Folia saiu dia 31 e a festa só encerrou na noite do dia 05 para o dia 06, com visitas às casas da comunidade, rezas, cantos de folia, jantar para todos os foliões e participantes da festa e muita catira, animando o encerramento.
Joaquim Santiago Barbosa conta que o grupo foi formado por causa de uma promessa feita por seu pai. “Quando eu tinha 10 anos quebrei uma perna e meu pai disse que ia rezar 10 anos para os Santos Reis para eu melhorar. Quando fiz 20 anos, quebrei a outra perna e ele fez a mesma promessa de continuarmos com a Folia”, conta ele.
Desde então, a família mantém essa tradição. Com o falecimento de Seu Francisco, patriarca da família e imperador da Folia, Henrique Alves da Silva assumiu a responsabilidade pelo grupo. Ele é sobrinho de Dona Josina, viúva do antigo imperador, e a considera como mãe. Henrique explica que é o folião de dia, aquele que conhece as cantorias e coordena o grupo. “Assumi a Folia porque Dona Josina ficou viúva e continuo no grupo até o dia em que Deus me tirar”, afirma Henrique.
A família de Seu Francisco é formada por 04 filhos e 05 filhas, com exceção de um, todos participam da Folia de Reis. Joaquim conta que atualmente cada filho mora em um lugar, “um em São Paulo, outro em Belo Horizonte, mas chega nessa época, todos se reúnem para sair com a Folia. Todo ano tiro férias nessa data para participar”.
LEMBRANÇAS
Todas as toadas, as músicas cantadas pelo grupo, foram criadas por Seu Francisco. O grupo usa violão, triângulo, pandeiro, caixa, sanfona, chocalho e palmas para a cantoria da Folia e da catira, que encerra as noites do festejo. Além dos filhos e filhas de Seu Francisco, outros foliões da comunidade fazem parte do grupo.
Após visitas às casas, o grupo se concentra na casa de Dona Josina, matriarca da família e atual imperadora da Folia, onde é servida farta refeição para toda a comunidade envolvida. “Todo ano a gente faz comida pra sobrar. No início minha vó é quem cuidava, agora somos as irmãs que fazemos”, fala Maria José Barbosa Santiago, uma das filhas de Dona Josina, responsável pela cozinha.
Henrique e os filhos de Seu Francisco lembram que antigamente o festejo era maior e mais gente participava. “Os pais foram morrendo e os filhos foram largando a Folia”, conta Manoel Barbosa, outro filho também folião. Henrique afirma que a juventude não gosta muito desta tradição, “alguns jovens gostam, mas não é todo mundo que tem o dom”. Ele percebe que recentemente na Comunidade alguns jovens se envolveram com o grupo e tem esperança que a tradição permaneça com eles.