O lançamento do livro “A Faixa de Gaza e Eu: Uma História para Contar”, da escritora Valdeli Gonçalves Coelho, será realizado no Sanchos Restaurante, às 19h, na próxima terça-feira, 18, na Rua Justino Câmara, centro.
Historiadora, mestre em Desenvolvimento Social e especialista em Oriente Médio, conflitos e religião islâmica, Valdeli nasceu em Belo Horizonte e foi criada em Montes Claros, onde acompanha desde a infância o desenvolvimento e as transformações da cidade.
“Este é o meu segundo livro. O primeiro foi a minha dissertação de mestrado, que se tornou o e-book “Ascensão do Hamas na Palestina: Pobreza e Assistência Social (1987-2006)”, conta a autora.
Nesta entrevista, Valdeli Coelho fala um pouco sobre sua nova obra.
Como nasceu a ideia de escrever “A Faixa de Gaza e Eu: Uma História para Contar”?
ideia de escrever A Faixa de Gaza e eu: uma história para contar nasceu de uma soma de caminhos, lembranças e descobertas que foram se cruzando ao longo da vida, quase como se tudo já estivesse traçado. As ideias e como conduzir a escrita eu já havia traçado em minha mente. Apenas demorei um pouco a colocar tudo no papel em função das demandas da vida, que nos atrasam. Mas o sonho desse livro já existia. Desde a infância, os livros que meu pai me presenteava me levavam a mundos distantes, cheios de mistério e areia e, de alguma forma, o Oriente Médio já habitava em mim — silencioso, mas pulsante. Mais tarde, esse fascínio se transformou em estudo, pesquisa e, finalmente, em escrita. O livro não nasceu de um simples desejo de contar uma história, mas da necessidade de dar sentido a uma trajetória que uniu o pessoal e o político, o íntimo e o global. Era como se a Faixa de Gaza tivesse atravessado o meu caminho para me mostrar que algumas causas não são apenas temas de pesquisa, mas experiências que nos escolhem. O livro é um relato das minhas experiências de vida que me influenciaram ao longo do tempo a escolher o Oriente Médio e a Faixa de Gaza como objetos de pesquisa, mas que se tornaram muito mais do que uma pesquisa, transformando-se em um encontro de almas, em uma jornada de autoconhecimento e empatia, revelando que compreender o outro é, antes de tudo, compreender a si mesma.
O título do livro já chama a atenção por unir o pessoal (eu) e o geopolítico (a Faixa de Gaza). Como essa relação se constrói na obra?
O título A Faixa de Gaza e eu surgiu justamente desse entrelaçamento entre duas dimensões: o “eu” — mulher, filha, professora, pesquisadora e, sobretudo, alguém movida por afetos e inquietações — e a “Faixa de Gaza”, símbolo de um conflito histórico, de resistência e dor, e onde pude conhecer pessoas e me conectar a elas. Essa junção no título não é um acaso; é uma síntese do próprio enredo da obra. No livro, essa relação se constrói de forma orgânica: Gaza é o cenário geopolítico, mas também é metáfora das fronteiras humanas que todos carregamos. Ao mesmo tempo em que eu pesquisava sobre o Hamas, os conflitos e as disputas políticas, me via espelhada na coragem, na sobrevivência e na esperança do povo palestino. Minha vivência, mesmo à distância, se misturou com a realidade de quem vive cercado por muros e ameaças constantes. Aos poucos, percebi que Gaza não era apenas “lá”, mas também “aqui dentro” — em mim, nas minhas perdas, nas minhas lutas e nas minhas tentativas de reconstrução. Meu envolvimento com a Faixa de Gaza não ficou restrito a uma pesquisa; foi um envolvimento emocional. Me casei e trouxe de lá meu ex-marido, da Faixa de Gaza, e, de uma forma bonita, pude transformar a vida dele e de seus parentes diretos, tirando-os de Gaza. Foi uma missão de alma que, depois de alguns anos, pude colocar neste livro.
Se pudesse definir o livro em uma frase, qual seria?
Diria que é a travessia de uma mulher que encontrou, em um povo distante, o reflexo de sua própria luta por sentido, liberdade e esperança. É um livro sobre encontros improváveis e destinos cruzados, sobre como a vida, mesmo entre ruínas, pode florescer. É também um testemunho de fé — não uma fé religiosa apenas, mas uma fé na humanidade, na capacidade de sentir e se solidarizar com o outro.
Ser uma escritora do Norte de Minas influencia sua forma de ver e narrar o mundo?
Quem nasce no sertão aprende cedo o valor da resistência e o poder da palavra dita no tempo certo. O Norte de Minas me ensinou a escutar o silêncio, a perceber a beleza nas coisas simples e a reconhecer força nas dores que moldam a alma. Quando escrevo, trago comigo essa perspectiva de quem vem de um lugar onde cada conquista é resultado de luta e, talvez por isso, ao falar da Faixa de Gaza, eu não vejo apenas um território em guerra, mas um povo cheio de humanidade, como o meu. Somos diferentes, sim, mas compartilhamos o mesmo impulso de resistir, de recomeçar, de transformar a dor em narrativa.
No fundo, A Faixa de Gaza e eu é mais que um livro — é um espelho entre mundos. É o encontro da mulher do Norte de Minas com a mulher do Oriente Médio, da pesquisadora com a sonhadora, da história pessoal com a história universal. É a certeza de que nada é por acaso, que cada passo, cada leitura, cada amizade feita à distância tinha um propósito: mostrar que a empatia não tem fronteiras e que a palavra pode ser uma forma de atravessar muros — reais ou simbólicos. Porque, como acredito desde sempre, tudo o que vivemos tem um sentido. E talvez o meu tenha sido este: transformar a dor e o encantamento que Gaza despertou em mim em uma história para contar.
(Foto divulgação)
Valdeli Gonçalves Coelho, escritora e historiadora (Foto divulgação)