Tarde de tensão e desespero na casa dos infratores: PM e dois menores feridos na primeira rebelião do Centro de integração do adolescente

Jornal O Norte
Publicado em 13/03/2006 às 10:45.Atualizado em 15/11/2021 às 08:30.

Gissele Niza


Repórter


onorte@onorte.net



Uma rebelião no CIA – Centro de internação do adolescente infrator de Montes Claros, no início da tarde de sexta-feira, 10, acabou com dois menores e um policial militar feridos e deixou os pais dos internos apavorados.



A primeira rebelião do CIA desde sua inauguração, no mês de novembro do ano passado, começou por volta das 13 horas e foi controlada pelo efetivo do 10º Batalhão de polícia militar sob o comando do tenente coronel Hely Gonçalves, depois de mais de duas horas.






Policiais se posicionam em frente ao CIA, que abrigava três


maiores de 18 anos
(Fotos: Wilson Medeiros e Rafael Bicalho)



Quatorze viaturas da PM, duas ambulâncias e mais de 50 militares do Gate - Grupo de ações táticas especiais e do batalhão de choque se deslocaram ao local (Cidade Industrial) no momento da rebelião, que envolveu 26 menores da ala permanente (construída para abrigar 40 menores (que deverão cumprir a pena máxima até os 21 anos) do CIA.



O COMEÇO



Segundo informações da PM, a rebelião foi organizada por um menor, Joaquim (*) acusado de assaltar caminhões de bebidas no Bairro Jardim Eldorado, e envolveu 26 menores, que fizeram como reféns o menor Pedro (*) e outro menor.



Depois de quebrar vários bebedouros, armários e celas do bloco B, os menores subiram no teto do pavilhão permanente e colocaram no pescoço de Pedro um chucho (arma artesanal em formato de faca) e começaram a gritar, enquanto outros menores continuavam a quebrar objetos do interior do centro.



Com camisas no rosto e fazendo muito barulho, os menores acenavam para os moradores da favela Coberta Suja, como se o refém fosse um troféu.



BOMBAS DE EFEITO MORAL



O comando do 10º BPM solicitou a presença da juíza da Vara da infância de Montes Claros, Sílvia Rodrigues Brito, e da promotora Valmira Maia, para presenciar as negociações para o fim da rebelião, coordenada pelo comandante Hely Gonçalves.






PM pronto para lançar mais uma bomba de efeito moral



Juntamente com 50 policiais, o comandante do 10º BPM entrou no CIA e, após o uso de bombas de efeito moral, foi controlada a rebelião e todos os menores foram levados ao pátio, para revista.



FERIDOS



No momento das negociações, dois menores saíram em uma ambulância do interior do Centro de internação de adolescentes infratores, um deles Pedro, o refém, com um corte no pescoço, e outro menor com várias lesões de agressões físicas.



De acordo com o tenente coronel Hely, um refém (Pedro) se machucou ao pular do teto do pavilhão, em um momento de distração dos menores que o cercavam. O outro menor ferido teria sido agredido por companheiros rebelados. Os feridos foram levados ao Hospital Aroldo Tourinho e, depois de medicados, foram levados de volta ao CIA.



Um militar que não teve o nome divulgado também se feriu, mas passa bem.



A juíza Sílvia Brito e a promotora Valmira Maia não fizeram declarações à imprensa, pois, segundo elas, estavam ali para acompanhar as negociações e não tinham dados precisos do motivo da rebelião.



REIVINDICAÇÕES



Questionado sobre o motivo da rebelião, o comandante do 10º BPM informou que não houve conversa com os rebelados.



- Não houve nenhuma reivindicação. Assim que o pelotão entrou e, após usarmos algumas bombas de efeito moral, os reféns foram liberado e a rebelião controlada. Agimos com rapidez e deixamos claro para os rebelados que sempre que tentarem agir desta forma, estaremos prontos para contornar a situação com agilidade – diz o tenente coronel.



No boletim de ocorrência da Polícia Militar foi registrado que um menor estava querendo fazer uma ligação telefônica e que pegou um dos colegas como refém e exigiu que um agente penitenciário abrisse a cela, momento que teve início a rebelião.



Ainda segundo o boletim de ocorrências, todo o pavilhão do bloco B do CIA foi destruído durante a rebelião.






No teto do Centro de internação, infratores acenam


para moradores do Coberta Suja



Informações extra-oficiais obtidas por O Norte na área externa do CIA dão conta de que os menores estariam reivindicando drogas, celulares e regalias, ou seja, visitas íntimas.



OUTRA VERSÃO



Cláudio (*), que esteve no local desde o início e presenciou as negociações, informou à reportagem que a rebelião começou por uma rixa pessoal:



- O líder da rebelião era o menor Joaquim, acusado de assaltar caminhões de bebidas. Ele tem uma rixa pessoal com Pedro (*), acusado de matar um idoso no ano passado para roubar uma televisão (latrocínio). Antes de ser encaminhados ao CIA, Joaquim deu vários tiros em Pedro, com intenção de matá-lo. E, ao reencontrar o inimigo pessoal no CIA, começou a planejar uma rebelião para chamar a atenção e aproveitar o momento para acabar com a vida de Pedro.



Ainda segundo Cláudio, as reivindicações dos menores eram de coisas supérfluas, como refrigerantes.



MAIS UM



Outra informação passada a O Norte no final da tarde de sexta-feira é de que, no início da rebelião, uma funcionária do CIA teria sido feita refém, mas liberada logo após conseguirem o alvo: Pedro.



Antes da rebelião houve também briga entre os menores, por motivos não divulgados pela PM.



REVOLTA



Do lado de fora do CIA, vários familiares dos menores internos declaravam revolta ao ver o efetivo da PM entrar no local.



O pedreiro Geraldo Ney Francisco, que tem dois filhos internados no CIA (um de 16 e outro de 14 anos) disse:



- Esses menores infratores que estão aí são frutos da sociedade. Foram criados pela sociedade que visa apenas o bem comum e esquece das pessoas carentes. Por que um pai não pode entrar para socorrer os filhos neste momento de tensão e os policiais fortemente armados podem? Isto é uma injustiça. Meus filhos estão aí para melhorar e sair da vida do crime, não merecem ser pressionados pela polícia. Estou revoltado com isso tudo que tá acontecendo.



TEMOR



Irmã de um dos detentos, a estudante M.S.T., 17 anos, chorava do lado de fora do CIA, temendo pela vida do menor de 14 anos:



- Sei que ele está aí para pagar as coisas erradas que cometeu. Toda a família está conformada e aliviada por saber que ele teve uma nova chance, mas temo pela vida dele. Por causa de outros menores, ele pode perder a vida.



CINCO INTERNOS ENCAMINHADOS AO CADEIÃO



Após a rebelião, foi realizado um levantamento dos integrantes da rebelião para identificar quais já são de maioridade.



- Cinco homens com idade superior a 18 anos serão encaminhados para a cadeia pública. Cada menor pode ficar aqui no Centro, de acordo com a decisão da justiça até os 21 anos, se tiver bom comportamento, uma vez que, participaram da rebelião cinco homens com mais de 18 anos, que tiveram comportamento indisciplinar e serão encaminhados à Cadeia pública de Montes Claros – informou o tenente coronel Hely Gonçalves.



AUSÊNCIA



A reportagem procurou a direção do CIA, mas foi informada de que o diretor estava em Belo Horizonte e nenhum funcionário estava autorizado a dar entrevista.



O Centro de internação do adolescente infrator de Moc conta hoje com 44 internos, sendo que, desses, nove são de outros municípios.



* nomes fictícios

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