O dia era 1º de dezembro de 1986, quando a sociedade de Montes Claros foi surpreendida por 56 jovens determinadas a dedicar suas vidas na prestação de serviços e promoção da paz social. Neste ano, o 10º Batalhão da polícia militar de Montes Claros sofreu uma grande mudança – que significou a conquista das mulheres da cidade e região.
Há 20 anos começou na cidade o primeiro Curso de formação de militares femininas, ou seja, era criada na cidade a Polícia Feminina.
O espaço, que antes era dominado pelos homens, foi dividido com as jovens guerreiras com espírito de luta, companheirismo, dedicação e principalmente força de vontade para servir a polícia militar de Minas Gerais.
VIDA
Formada na primeira turma, a cabo Simone Cássia Souto Belém Cruz, define sua profissão hoje, após 20 anos de serviços prestados à PMMG, um pedaço de sua vida.
- A polícia militar é tudo na minha vida. Ao nos tornarmos policiais, a conquista é de todas as mulheres. E, por termos o lado materno, somos como o braço direito dos policiais nos momentos de maior tensão, pois, sempre, temos uma palavra de incentivo, sensibilidade e carinho – afirma a policial.
PRECONCEITO
A cabo Simone também lembra que no início a conquista das mulheres assustou muita gente. Nas ruas, chegaram a enfrentar olhares curiosos, de reprovação. Eram até questionadas.
- A vontade de servir a polícia militar e de promover a segurança pública e os aplausos e incentivos dos que compreendiam nossa presença na polícia feminina a conquista de todas, nos fizeram seguir em frente e lutar a cada dia pelos nossos ideais de servir sempre a todos e lutar pela promoção da paz – completou a cabo.
SENSIBILIDADE
A cada novo ano, novas conquistas são adquiridas pela polícia feminina e as atividades desempenhadas são as mesmas dos homens. As mulheres atuam em todas as áreas: no policiamento ostensivo, no trânsito, na guarda, no Copom, na administração, guarnição de patrulha de prevenção ativa, até no Proerd – Programa educacional de resistência às drogas.
Para o sargento Luiz Ferreira, a policia feminina não é uma conquista apenas das mulheres, mas de toda a sociedade.
- A sensibilidade e o olhar feminino, que consegue enxergar as situações diárias de vários ângulos, foram primordiais para o êxito da prestação de serviço da polícia militar em Montes Claros nestes 20 anos, principalmente na área operacional, quando tínhamos dificuldade nas abordagens de mulheres suspeitas. Hoje, o trabalho, seja o trabalho operacional ou o administrativo, todos eles são desempenhados com sucesso devido à garra e coragem dessas guerreiras – afirmou o sargento.
Para o tenente Welington Eduardo, as policiais desenvolvem o seu trabalho tão bem como os policiais.
- O brilho do trabalho das policiais femininas só afirma o potencial das mulheres que a cada dia conquistam êxito nos diversos setores da sociedade – afirmou.
PROFISSÃO DE VALOR
Formada como sargento na polícia militar de Belo Horizonte, em 1987, e há dez anos prestando serviços em Montes Claros, Selma Alves, hoje com patente de capitã, conta que entrou na polícia por influência do pai - que era militar, e que hoje tem a certeza de ter feito a escolha certa em todos os sentidos.
- A polícia militar é a minha realização pessoal por ter uma profissão que é reconhecida socialmente, de valor, além de ter me proporcionado uma vida estável economicamente. A polícia nos amadurece e nos ensina a superar limites enquanto pessoa, a enfrentar melhor os problemas da vida. Acredito que o próprio fato de conviver com o lado ruim da sociedade nos faz dar valor nas pequenas coisas da vida – disse a capitã.
- Para as mulheres que querem ingressar na polícia militar, em primeiro lugar, é preciso estudar muito porque o concurso é muito concorrido; segundo, ter muita força de vontade para correr atrás dos seus sonhos; e terceiro e principal: só entre para polícia militar se realmente estiver disposta a se doar para profissão, porque a doação pessoal é uma exigência da profissão e a futura policial feminina deve estar pronta para essa doação - completou.
HUMANIZAÇÃO
O comandante da 3º região de polícia militar, coronel Geraldo Magela, credita a humanização da prestação de serviços à sociedade pela polícia militar, ao ingresso da polícia feminina à corporação.
- A polícia feminina na polícia militar veio com a evolução da mulher na sociedade, e contribuiu de forma significativa para a humanização da prestação de serviços à população. A sensibilidade e a visão feminina têm contribuído a cada dia para o melhor desempenho das funções da polícia militar – afirma o coronel.
HOMENAGEM
“Grandes coisas fez o senhor por nós, e por isso estamos alegres”
(Salmo 126:03)
Provas escritas, exames laboratoriais, psicológicos, e o resultado final: aprovadas.
Cinqüenta e duas mulheres grávidas de um sonho: o ingresso nas fileiras da Polícia Militar.
Nossa gravidez não duraria nove meses, mas seis.
Parecia um sonho. Um sonho tão sonhado, de lágrimas, gerado. Sonhávamos, esperávamos, e finalmente o dia 1º de dezembro de 1986 chegou. E o nosso sonho se realizou.
Um sonho tão sonhado, e nós, dormindo e acordadas; sorríamos, vivíamos a cantar, gargalhar e até a chorar - de alegria.
Aprender a marchar, a idéia da fita vermelha no braço direito, os incentivos do capitão Reis, o cuidado da sargento Kátia Simone, o temido RDPM. O bate-papo na cantina do sub-tenente Macarrão, as fotos de Celestino, a marcha diurna, aprender a atirar.
Marcha noturna, o acampamento e o tal do guerrilheiro não apareceu. Nosso grêmios, os calos feitos pelo batibuti, as calúnias, as discriminações, a maravilhosa detenção em conjunto no alojamento com os bolos de Dona Joana, sargento Maysa e o famoso refrão: quando o corpo não agüenta, a moral é que sustenta.
A comida no rancho, o cuidado do cabo Belém, os serviços de faxina aos sábados, as aulas de ataque de defesa, estágio na rua e a formatura no dia 8 de junho de 1987.
O orgulho da nossa família, amigos e da nossa madrinha doutora Neuza.
Daquelas cinqüenta e uma grávidas, nasceram as primeiras Policiais Femininas. Pioneiras – e o caminho foi aberto para as outras que viriam depois.
Deus estava conosco. Outras vitórias estavam por chegar.
Quem saía andando e chorando, semeando sua semente com júbilo, voltará certamente a cantar, gargalhar, até chorar de alegria.
Zeth e Lú, vocês fazem parte da nossa festa.
Foi maravilhoso termos convivido com vocês.
Saudades amadas!
A Deus, toda a honra e toda a glória. Nós vencemos meninas. Chegamos enxutas e bonitonas aos 20.
Que a mão forte do nosso Deus continue a repousar sobre nós.
Uma homenagem da Cabo Simone Belém às guerreiras mulheres que em 1986 ingressaram na polícia feminina e fazem parte de um marco histórico da Polícia Militar de Minas Gerais.