Cinza dá lugar ao brilho

Grafite: a arte urbana que muda a cara do mundo

Manoel Freitas
Publicado em 19/05/2023 às 22:21.
Cores do grafite quebram a monotonia das cenas urbanas. Aos poucos, o cinza modorrento dá lugar a cores vibrantes e alegres. (Giw /arquivo pessoal)

Cores do grafite quebram a monotonia das cenas urbanas. Aos poucos, o cinza modorrento dá lugar a cores vibrantes e alegres. (Giw /arquivo pessoal)

A despeito de existir resquícios do grafite, grafito ou grafismo desde o Império Romano, seu começo ocorreu de fato na Idade Contemporânea, na década de 1970, em Nova Iorque, nos Estados Unidos. Foi para contar um pouco dessa arte urbana, que ganha força especialmente nos médios e grandes centros urbanos, que O NORTE contou com a vivência de três personagens que, cada um a seu modo, faz parte dessa história no Norte de Minas. 

De tal forma que, desde que ganharam espaços, em locais públicos e privados, as marcas nas paredes testemunham como essa arte evoluiu, sobretudo com o surgimento de novas técnicas e desenhos. No seu nascedouro utilizado como críticas sociais, na atualidade representam intervenção direta na cidade, promovendo a democracia dos espaços, tirando cinzas do caminho, espalhando brilhos, formas e cores por todo lado.

Sem contar que, naturalmente, melhora e o humor das pessoas na medida em que se impõe, que se transforma em autênticas galerias a céu aberto, com talento de artistas não tão anônimos como no passado. Pelo contrário: além da assinatura, em cada mural ficam impregnadas as digitais, a identidade desses artistas que - por sua força - não precisam mais pedir licença para entrar. 

Portanto, a arte de grafitar pode provocar impactos distintos entre as pessoas, mas é inegável que é, nos dias atuais, valioso veículo de comunicação urbana, que dá voz a talentos no passado amordaçados pelo preconceito. Não é à toa que o estilo dos grafiteiros do Brasil é reconhecido entre os melhores do mundo. 
 
A MAGIA DA ARTE
Para dar os primeiros passos, luz aos caminhos que conduzem ao grafite na cena montes-clarense, O NORTE bateu às portas do jornalista e mágico Júlio Rasec, graduado na Funorte, ele que respira arte noite e dia. O encantamento pelas formas e cores foi completo quando escolheu a arte urbana como tema de seu trabalho de conclusão de curso, quando colocou o pé na estrada, mergulhou de ponta cabeça nesse universo em que a arte e a cultura andam de mãos dadas.

“Foram muitos meses visitando eventos, participando de pinturas nas ruas e praças de Montes Claros, de encontros de grafiteiros, nos quais eles debatiam sobre novas técnicas e os nos rumos dessa arte”, explica Rasec, revelando que nessa imersão “descobrimos cidadãos de vários níveis sociais que tinham um fascínio gigantesco em levar um pouco de vida a espaços antes dominados pelo cinza, sem nenhum brilho”.

Mais ainda, esclareceu que “na verdade escolhemos o grafite por se tratar, aos nossos olhos, de um tipo de arte marginalizada pela sociedade”. É que, durante a graduação, percebeu que havia um sentido e um clamor nesse tipo de pintura. “A partir daí”, argumentou, “decidimos contar a história do grafite em Montes Claros a partir da narrativa dos artistas, com o intuito de esclarecer para a sociedade a importância dessa arte, suas raízes e bandeiras”.

Na jornada, diz ter conhecido “cidadãos de vários níveis sociais que tinham um fascínio gigantesco de levar um pouco de vida a esses espaços”. Opinou que “o fato do grafite surgir da pichação, atraiu para si um olhar pejorativo, desmistificado durante a convivência com esses verdadeiros artistas, não só pela técnica, mas artistas pelo olhar e pela sua essência”. 

Desenho animado e ficção científica

O autodidata Gilberto Diório Vargas Júnior, ou simplesmente Giw, representa – e muito bem – os grafiteiros que, cada dia mais, fazem uso de seu talento para mudar e humanizar a cena urbana de Montes Claros. Natural de Francisco Dumont, alcança maior maturidade ainda aos 32 anos, depois de conhecer a arte em São Paulo e aperfeiçoá-la no Paraná, caminhada que possibilitou produzir mural na fábrica Cosmos Lac, em Atenas, na Grécia, onde são fabricadas as latas de spray das marcar Flame e Molotow. 

A O NORTE, revelou ter iniciado as atividades artísticas em 2007, tendo como influencia no seu estilo desenhos animados e histórias de ficção científica. Antes, entretanto, foi “de tudo um pouco”: tatuador, instalador de antenas em torres e forros, metalúrgico, ajudante de pintor. 

“Quando eu vou pintar na rua, quando parte de mim, pinto ideias que vou acumulando, coisas que estudo, que vejo, que reflito; agora, quando o cliente me contrata, mesmo que ele fale fique à vontade, vou falar também sobre ele senão não faz sentido”, observa Giw, explicando ainda que trabalha o assunto da pessoa, “mas não deixa de ter minha identidade, por isso a clientela tem aumentado na medida em que meu trabalho é conhecido”. 

“Dependendo do espaço, não compensa encher de detalhes, porque o campo de visão das pessoas não vai captar um muro de avenida; por outro lado, quando o ambiente é mais fechado, aí compensa colocar bastante detalhe”, revela o artista, que cobra em média de 200 a 250 reais por metro quadrado. 

Democratização e humanização 

Para abordar a importância do grafismo, O NORTE ouviu Lidiane da Silva Santos, graduada em Artes Plásticas pela Universidade Estadual de Montes Claros. No seu modo de entender, “não existem barreiras para o grafismo, porque dentro das propostas de arte contemporânea, é a que chega mais aos nossos alunos, e a toda população”.

Segundo a professora, “trata-se de arte muito viva, muito rápida, dinâmica, porque quando acontece um fato histórico, regional, os grafiteiros conseguem expressar sua arte, sua visão sobre aquilo de uma maneira muito imediata, de modo que o grafite provoca essa democratização porque ela não precisa desses espaços públicos, como museus e galerias de artes, o que faz com que seu alcance seja muito maior”.

Frisou que leva o grafite para a sala de aula “para que os alunos entendam como manifestação contemporânea bastante rica, porque tem essa capacidade de humanizar a arte, principalmente nos grandes centros, onde predomina o cinza, então, quando você leva a cor, a arte, você leva vida, porque o grafite tem essa capacidade”. 

“O grafiteiro pode fazer uma produção no espaço privado, mas ele sempre vai ter a possibilidade de produzir ao ar livre, ou seja, vai atingir todos, enquanto uma tela, independentemente do artista ser conhecido ou não, ela vai estar dentro de um museu, de uma galeria ou de um colecionador, portanto, estará restrita”. Por outro lado, chama atenção a professora Lidiane, “o grafite está na rua, para quem gosta e para quem não gosta de arte, para os mais novos, mais velhos, os ricos, os pobres, chega a todos, e isso é fantástico, porque não existem barreiras para o grafismo”. 

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