O jornalista e escritor montes-clarense Alberto Sena lança, no dia 23 de maio, na Galeria do Centro Cultural, o seu terceiro livro: “Darcy Ribeiro do Fazimento”, contando sua convivência com o professor ilustre, cuja obra fez dele múltiplos personagens — sociólogo, antropólogo, escritor, político, indigenista…
Nesta entrevista, Alberto Sena conta um pouco da convivência com Darcy.
O seu relacionamento com Darcy Ribeiro começou em Montes Claros?
Não. Foi muito depois, no ano de 1987, quando fui convidado para integrar a assessoria de imprensa dele, nomeado secretário Extraordinário para Assuntos Sociais e de Desenvolvimento de Minas Gerais, junto ao também jornalista Olavo da Cunha Pereira. Em Montes Claros, quando repórter d’O Jornal de Montes Claros, convivi com Mário Ribeiro, Marão e Paulinho, filho dele.
Quando aflorou o escritor? “Darcy Ribeiro do Fazimento” é o seu terceiro livro. E os outros dois?
O escritor sempre existiu em mim e fazia literatura até mesmo no dia a dia do jornalismo. O primeiro foi “Nos Pirineus da Alma”, sobre a caminhada que fiz em companhia de Silvia (esposa) duas vezes, no Caminho de Santiago de Compostela, na França e na Espanha, em 2001 e 2002. Fizemos ao todo 1.300 quilômetros somados. Quinze anos depois, nasceu o livro. O outro, “Retrato de Nós Mesmos”, é sobre o tempo vivido em Montes Claros até o dia da partida, em 1972.
E este terceiro, como se deu?
Eu não podia deixar de fazer este terceiro, “Darcy Ribeiro do Fazimento”, que, aliás, já estava escrito há tempo. Agora é a ocasião do lançamento, porque há tempo para tudo, como reza o Eclesiastes. Se eu não fizesse este livro, ficaria em dívida com Darcy, porque, absurdamente, como conto nele, esse montes-clarense mais ilustre temia não ser lembrado depois da morte. E se eu, que convivi com ele durante sete meses, em Belo Horizonte, na assessoria de imprensa dele, não escrevesse nada, claro, mais dia menos dia, Darcy iria cobrar de mim. Então, para poupá-lo, registrei a experiência com ele, baseado naquilo que fazia a alegria dele: a escola.
Ele veio para Minas a convite do então governador Newton Cardoso, para criar aqui as escolas de ensino de tempo integral, mas acabou não conseguindo executar.
Darcy veio para construir uma “fábrica de escola”, como dizia, que espalharia por todas as Minas Gerais as escolas de argamassa armada, de baixo custo, que prescindiam do ferro e do aço. Mas, ao contrário do poeta Carlos Drummond de Andrade, que encontrou uma pedra no seu caminho, Darcy encontrou pelotas de ferro e de aço. Como ele não tinha tempo a perder, porque tinha pressa de viver e executar os seus sonhos, ele preferiu não ficar aqui batendo boca e foi-se embora para o Rio de Janeiro. Depois foi criar em São Paulo o “Memorial da América Latina”.
Foi realmente uma pena.
A escola sempre fez a alegria de Darcy. Se dependesse só dele, não haveria nenhum brasileiro analfabeto. E, na outra ponta, a intenção dele era criar a Universidade do Saber.
Como seria?
Acostumado a criar e reformar universidades, haja vista a Universidade de Brasília (UnB), que só surgiu porque Darcy insistiu tanto, ao final ele queria reunir, na Universidade do Saber, as cabeças mais preparadas, a fim de tornar o Brasil a maior potência do mundo. Não das armas, mas do Saber, do Conhecimento.
Hoje, o Brasil precisaria de uma meia dúzia de Darcys?
Acho sim. Ele era um homem de fato genial, que alimentava amor desmesurável ao povo brasileiro, raça formada por branco, preto e indígena. Não há nada igual no mundo. Segundo Darcy, essa miscigenação é a explicação da competência dos brasileiros. Na opinião dele, o que falta aos brasileiros de baixa condição é comida e escola. Por isso, ele queria fazer aqui essa escola para onde a juventude brasileira iria toda manhã e seria recebida com um bom café da manhã e depois iria para a sala de aula. Teria atividade esportiva, de arte e trabalho manual, almoçaria e voltaria para a sala e só iria embora no final do dia, de banho tomado.
Ótimo!
Pois é, só que ele encontrou aqui as tais pelotas de ferro e aço. Os interesses econômicos, como sempre, estavam acima de qualquer coisa.
Sua expectativa para o dia 23.
A melhor, pelo apoio que tenho recebido, sobretudo da Academia Montes-clarense de Letras, que presidirá o evento. Será uma noite memorável.