entrevista

A literatura como forma de reflexão sobre a tragédia

Autora relata a história que resultou na perda da visão de seu amigo

Adriana Queiroz
genteideiascomunicacao@gmail.com
Publicado em 27/02/2024 às 19:00.

“Antônio - Olhos da Vida” é o nono livro da norte-mineira Karla Celene, professora de Literatura, poeta e escritora, lançado no último sábado (24) em Montes Claros. O livro narra a trajetória de Antônio Carlos Mendes de Oliveira, desde uma infância feliz no sertão de Minas até a cegueira irreversível, resultante da ingestão de uma bebida que continha uma substância tóxica, em uma conhecida tragédia ocorrida em Belo Horizonte em 2020.
 
Qual grau de parentesco com Antônio Carlos Mendes de Oliveira?
Meu conterrâneo de Francisco Sá. Amigo de infância, adolescência, juventude e maturidade. É meu cunhado, casado com minha irmã Kenny Vanessa.
 
Uma tragédia levou você a escrever a história de Antônio. Como surgiu a ideia do livro?
A ideia surgiu a partir das minhas anotações em diários. Anoto tudo o que vivo em diários desde a adolescência. Tenho milhares. Escrever é uma forma de não deixar páginas em branco. É registrar para guardar. E em momentos de turbulência, como foi o período da tragédia de Antônio, escrevi em busca de alívio. Assim surgiu a ideia de escrever o livro. Eu tinha já o material em vivido escrito e a consciência de que essa tragédia não pode ser esquecida. E não pode acontecer outra vez. Vidas importam!
 
Sabendo de tudo que viveram, acredita que os sobreviventes conseguirão lidar com os traumas?
O trauma é algo profundo que marca até a raiz da alma. No momento do desespero, a gente pensa que não vai prosseguir, reerguer-se. É aí que entram os grandes valores: a fé, a esperança, a solidariedade, o amor à vida. Esses são alguns dos ingredientes imprescindíveis para a reconstrução. A cicatrização do trauma. O fazer a vida, outra vez, amanhecer.
 
Como foi o processo da escrita, a dosagem dos sentimentos por exemplo?
Escrever o livro, externar as dores, os traumas, fazer da dor literatura é uma forma de salvação. Arte cura. Literatura cura. E esse livro não é só um relato objetivo, imparcial. Trata-se de arte literária com muitas intertextualidades com grandes escritores.
 
O livro é uma forma de manter viva na memória da sociedade a tragédia?
O livro é uma forma de manter viva duas tragédias que aconteceram simultaneamente: a tragédia particular de Antônio, dentro da tragédia universal da pandemia. O leitor de daqui a duzentos anos, ao ler o livro, vai saber como vivemos aqueles tempos. O leitor de qualquer tempo vai saber que no verão de 2020 um composto químico intruso numa cerveja causou envenenamentos. Dez morreram. Muitos ficaram sequelados. Antônio ficou 164 dias hospitalizado. Cegueira irreversível. Sem os dois rins. E muito tempo em encarceramento corporal. Teve que reaprender a fazer tudo.
 
E o lançamento? Como foi?
O lançamento superou todas as expectativas. Lotou o amplo ambiente. Mesas e cadeiras extras foram providenciadas. Antônio estava presente e subiu ao palco. E agradeceu. Como o livro faz muita referência à poesia, declamamos poesia. Como o livro faz muita referência à música – que ajudou António a reaprender a viver na escuridão, Júlio e João, tocadores experientes de Francisco Sá e personagens do livro, tocaram músicas e encantaram. Enfim, noite de sucesso artístico e cultural. Uma energia maravilhosa se fez presente e contagiou a todos.
 
Para finalizarmos, qual o maior ensinamento que o livro/ Antônio olhos da vida) nos revela?
O ensinamento que o livro traz é seguir em frente. Acreditar que o amor à vida e a perseverança levam à superação. Ter fé e coração aberto. E abrir a alma para ver para além dos olhos físicos.

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