Atendimento com atraso

Diagnóstico tardio agrava casos de câncer de cabeça e pescoço em Minas

Larissa Durães*
larissa.duraes@funorte.edu.br
Publicado em 28/01/2025 às 19:00.
Gaspar Narciso notou os primeiros indícios de problema em 2008, com mudanças na voz e lesões que persistiam sem curar (arquivo pessoal)
Gaspar Narciso notou os primeiros indícios de problema em 2008, com mudanças na voz e lesões que persistiam sem curar (arquivo pessoal)

Pesquisa do Instituto Nacional do Câncer (Inca) revela que 80% dos casos de câncer de cabeça e pescoço no Brasil são identificados em estágio avançado, conforme publicação na revista The Lancet Regional Health Americas. O estudo, abrangendo 145 mil casos de 2000 a 2017, destaca que pacientes com menor escolaridade são mais propensos a receber diagnósticos tardios. A detecção precoce pode elevar as taxas de cura para até 90%. Sintomas como feridas não cicatrizadas, rouquidão persistente, desconforto na garganta e nódulos no pescoço são sinais de alerta importantes.

Os tumores abrangem regiões como boca, orofaringe, laringe, nariz, tireoide e pele do rosto e pescoço. Embora a maioria dos pacientes diagnosticados tenha mais de 60 anos, os casos mais agressivos ocorrem em pessoas entre 30 e 50 anos, predominantemente homens de baixa escolaridade que fumam e consomem álcool.

Durante o II Fórum de Discussão e Enfrentamento do Câncer em Minas Gerais, realizado em Montes Claros em novembro de 2024, a então secretária Municipal de Saúde, Dulce Pimenta, apresentou que, nos últimos três anos, Minas Gerais registrou quase 14 mil novos casos de câncer de cabeça e pescoço. Desse total, pouco mais de 10 mil pacientes iniciaram tratamento, sendo que 77% foram atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A macrorregião Norte de Minas teve 1.184 casos entre 2021 e 2023. Destes, quase 74% foram diagnosticados nos estágios 3 e 4 da doença, quando as chances de cura são drasticamente reduzidas. “Mais de 80% dos pacientes chegam ao sistema de saúde com a doença em estágio avançado, sem diagnóstico precoce”, destacou Dulce.

Pimenta explicou também que a lei dos 60 dias, que estabelece o prazo máximo para iniciar o tratamento após o diagnóstico, também não tem sido cumprida. No caso de câncer de cabeça e pescoço, 59,2% dos pacientes já chegam ao atendimento com atraso, comprometendo ainda mais o prognóstico.

Cristina Durães, dentista especializada em prótese bucomaxilofacial e odontologia hospitalar, destacou os desafios enfrentados na detecção precoce da doença. Segundo ela, a negligência com a própria saúde e a falta de informações sobre autocuidado são fatores críticos. “Os pacientes precisam realizar o autoexame diariamente, observando a boca, a língua, os lábios e o pescoço. Qualquer alteração que não melhore em 15 dias deve ser motivo para procurar um médico ou dentista imediatamente”, explicou.

A dentista também apontou a escassez de profissionais especializados em Montes Claros como um problema grave. “Temos apenas três médicos na área, e apenas um atende pelo SUS com maior frequência. Essa situação gera uma longa espera, e o câncer não pode esperar”, afirmou.

A especialista defendeu campanhas de educação em saúde e o incentivo a hábitos saudáveis como estratégias para combater a doença. “É essencial promover o letramento em saúde, educando as pessoas sobre como se cuidar, identificar sinais de alerta e buscar ajuda médica”, reforçou.

O paciente, Gaspar Narciso, começou a perceber sinais de alerta em 2008, quando notou alterações na voz e feridas que não cicatrizavam. “No início, a gente acha que não é nada”, relembra.

Em 2016, a situação piorou e ele procurou um médico no Programa Saúde da Família (PSF), onde teve o diagnóstico de câncer em estágio avançado. “O médico disse que minha garganta estava comprometida e pediu uma biópsia. Como a espera pelo SUS era de seis meses, precisei fazer o exame particular com a ajuda de um amigo”, contou.

Após o diagnóstico, Gaspar passou por 36 sessões de radioterapia e três de quimioterapia. Apesar de não ser fumante e consumir álcool apenas ocasionalmente, ele acredita que sua recuperação está sendo facilitada por não ter esses hábitos. “Acho que o fato de eu nunca ter fumado me ajudou muito, porque os outros pacientes que eram fumantes já faleceram todos”, disse.

*Com informações da Agência Brasil

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