'Coquetel' contra a Covid-19 viraliza no WhatsApp e preocupa médicos

Infectologista alerta que “indicações” contra Covid se espalham pelo WhatsApp

Luisana Gontijo
Hoje em Dia - Belo Horizonte
21/07/2020 às 02:04.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:04
 (Fotos Maurício Vieira/hoje em dia)

(Fotos Maurício Vieira/hoje em dia)

Ainda não há vacina ou medicamento comprovadamente eficaz contra a Covid-19. Até aqui, a ciência já atestou que é possível conter a disseminação do novo coronavírus com atitudes como distanciamento social, uso de máscara em espaços públicos e higienização correta das mãos. Mas tem muita gente alheia a isso arriscando a própria saúde com autome-dicação. As “receitas” se espalham rapidamente pelo WhatsApp. 

“A gente tem visto, infelizmente, que a fonte de informação de uma parcela importante da população tem sido relatos no WhatsApp e isso é um risco enorme”, avisa o infectologista Unaí Tupinambás, professor da UFMG e integrante do Comitê de Enfrentamento à Epidemia de Covid-19 da Prefeitura de BH. 

“Temos registrado efeitos colaterais importantes, não só dessas medicações que as pessoas acham que evitam ou tratam o novo coronavírus, mas da automedicação para outras condições também”, observa.

As redes sociais, de maneira geral, estão cheias de “indicações” de remédios supostamente para combater Covid-19. A bola da vez é o vermífugo Ivermectina, mas há também informações sobre consumo casado com vitamina D, Zinco e Azitromicina – espécie de “coquetel” contra a doença. A eficácia não é comprovada. Além do mais, consumido por conta própria, sem a avaliação médica, o quadro clínico pode se agravar, ressalta o especialista.

Comunicado recente da Sociedade Brasileira de Infectologia condena o que chama de divulgações inadequadas nas mídias sociais, sem evidência científica, que desinformam o público sobre o uso de remédios contra a Covid-19.

A professora aposentada Elisabeth Lino da Silva está entre as pessoas que fizeram uso de Ivermectina com a intenção de prevenir a Covid-19. Revela que soube do fármaco pelas redes sociais. “Percebi que muitos amigos estavam aderindo. Não fui tomando rapidamente, comecei a pesquisar. Estamos tão desesperados, mesmo sabendo que os cientistas estão trabalhando por nós, que estou usando também própolis spray na garganta toda vez que sinto um desconforto”.

Com sintomas similares aos de uma gripe forte, que ela admite ter associado a sinais de coronavírus, a secretária Vera Aparecida Carlos, de 63 anos, diabética, fez uma consulta on-line pelo SUS e recebeu receita médica com indicação para se tratar com zinco, corticoide (Azitromicina) e Ivermectina. Isso, mesmo sem o teste diagnóstico para Covid.

“Achei que podia ser coronavírus, por causa dos primeiros sintomas e da neura em que estamos todos”, reconhece Vera, dizendo que tomou “uma dose pesada do vermífugo, de três comprimidos por três dias”.
 
SUPERDOSAGEM 
O infectologista Unaí Tupinambás adverte que a indicação da Ivermectina para tratar verminose é em dose única. “A gente nunca a usou por mais de um dia. Agora, pessoas estão usando por quatro dias, a cada 15 dias. Não sei se essa dose acumulada pode ter efeito, muito menos contra Covid. As pessoas precisam ter mais calma, escutar mais a ciência e os dados da literatura médica”. 

Questionada sobre a receita prescrita a Vera Carlos, a PBH respondeu que desde abril oferece consulta on-line para casos suspeitos da doença, com sintomas como tosse, dor de garganta, congestão nasal e coriza, com ou sem febre.

A PBH apontou ainda que “é prerrogativa do médico prescrever ou não qualquer medicamento, de acordo com o quadro clínico e a necessidade de cada paciente, nas doses recomendadas”.

SAIBA MAIS/
“É estranho as pessoas tomarem remédios por conta própria porque os únicos dados na literatura médica, e são dados muito importantes, apontam que temos ferramentas para combater a Covid-19, e ferramentas leves”, diz o infectologista Unaí Tupinambás. 

“Se a pessoa usar máscara de forma adequada, se mantiver um distanciamento social de dois metros do seu interlocutor, se evitar aglomerações – não for a festas, não for a reuniões desnecessariamente – e lavar as mãos, isso tem um impacto importantíssimo na saúde, contra o novo coronavírus”, reafirma o médico. Essas ações, pondera, são muito melhores do que tomar remédio. 

Na Alemanha, um país que menos usou essas chamadas terapias milagrosas, diz Unaí Tupinambás, a taxa de mortalidade foi menor. Já na Espanha, por exemplo, onde vários profissionais e pessoas com Covid apostaram nisso, a mortalidade em decorrência da enfermidade foi muito mais alta, ressalta ele.

O especialista reforça que usar medicamento sem indicação comprovada é um risco a mais de complicação da doença. Esses medicamentos podem ter efeitos colaterais que, inclusive, podem levar quem os consome para o hospital. 

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