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Domingo,10 de Novembro

Vem aí a PAC - por Roberto Pompeu de Toledo

Jornal O Norte
25/01/2007 às 10:06.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:56

Roberto Pompeu de Toledo *

Ânimo, brava gente brasileira. Tudo vai melhorar. Vem aí o PAC. Se o leitor não sabe o que é PAC é porque, tal qual o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, morreu de sono durante o discurso de posse de Lula no Congresso. A certa altura, disse o presidente que, para atingir o ansiado crescimento, o governo lançará “um conjunto de medidas englobadas no Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC”. Foi uma surpresa saber que o programa já tem nome e, não bastasse o nome, já vem com sigla. Até então, o que circulava é que o governo lançará um pacote de medidas para desonerar a produção e “destravar” o país, como gosta de dizer o presidente. O pacote era para ser lançado no mês passado. Não houve acordo quanto ao que deveria conter e foi adiado. Até onde se sabia, na semana passada, ainda não havia acordo e portanto não havia pacote algum. Mas nome já tem, e mesmo uma sonora sigla, para ajudar na conquista da intimidade e do afeto dos brasileiros, sinal de que já chamaram o publicitário.

É assim que opera o governo Lula: antes de mais nada, chama o publicitário. Publicitários são ótimos para batizar as iniciativas da administração. “Fome zero” é uma de suas criações. Não se tinha idéia de onde buscar os recursos, de como definir quem eram os famintos, como cadastrá-los e como fazer os alimentos chegar às devidas bocas. Aliás, continua não se tendo. Mas como resistir a um nome desses? O “zero” estava na moda. Vinha de “tolerância zero”, um programa de segurança pública em Nova York que, até ser desmascarado por Millôr Fernandes, com a lembrança de que “tolerância zero” equivale a “intolerância cem”, fez furor. “Fome zero” foi um achado. Tinha de ser usado, mesmo sem o mapa da mina dos famélicos e muito menos as estratégias para satisfazê-los.

Ressalve-se, a favor de Lula, que todo governo gosta de nomes bonitos e chamativos para seus programas. O governo de São Paulo tem (ou teve) o “Poupatempo”, o “Sonho Meu”, o “Dose Certa”. Um estrangeiro que julgasse os governos brasileiros pelo nome dos programas só teria razões para aplaudir. Eis um governo – no caso do paulista – que poupa à população o tempo que de outra forma seria malversado na burocracia, que transforma em realidade o sonho da casa própria, que distribui remédios na dose certa. O que diferencia o governo Lula é, primeiro, que ele gosta dos nomes bonitos mais do que os outros e, segundo – e principalmente –, que lança mão deles mesmo quando o programa não existe. O governo ainda se esforça em fazer crer que o Fome Zero existe. No mesmo discurso, Lula referiu-se ao Bolsa Família (outro nome bonito) como o “principal instrumento do Fome Zero”. É um truque para salvar a face. O Bolsa Família é a unificação e ampliação de programas criados por Fernando Henrique. O Fome Zero pretendia ser outra coisa.

Programa de Aceleração do Crescimento, PAC, não é um nome bonito. Mas não é menos marqueteiro, nem se pense que achá-lo deu menos trabalho. A questão agora era encontrar um nome que, com burocrática sobriedade, transmitisse propósitos solidamente maturados. Não era o caso de recorrer às marcas-slogans, como Fome Zero. Podem-se imaginar as dificuldades enfrentadas pelos cérebros que o engendraram. A primeira palavra que lhes ocorreu só pode ter sido “destravamento”, tão do gosto presidencial. “Programa de Destravamento do Brasil”, que tal? Ou “Programa da Retirada das Travas”? Ruim. As cabeças ferviam, queimavam-se as pestanas. “Programa de Crescimento Rápido”? Melhor. Mas como extrair daí uma sigla fácil? PCR parece nome de partido. Aliás, já foi nome de partido. Precisamos de uma vogal no meio. Meu reino por uma vogal! “Programa de Incremento do Crescimento, PIC”? Quase. “Programa Unificado de Crescimento, PUC”? PUC é Pontifícia Universidade Católica. E “aceleração”? “Programa de Aceleração do Crescimento”?


Você é um gênio! Achamos.

Uma consulta ao Google, na quinta-feira, resultou em 791 000 citações de PAC, em textos em português. Permita-se ficar com as vinte iniciais. A primeira refere-se ao “Programa Administrador do Cadastro”, do Ministério da Educação. A mais freqüente leva à “Política Agrícola Comum”, da União Européia. Figuram ainda o PAC dos Correios (um serviço de encomenda econômica), o Pronto Atendimento ao Cidadão do Detran do Amazonas, o Programa de Avaliação Continuada da Uniderp (Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal), o Pac-Man, popular jogo eletrônico, e até o Posto de Atendimento ao Cidadão do simpático município português da Guarda. Nada do Programa de Aceleração do Crescimento. Talvez ele figure entre as 790 980 citações restantes, mas o fato de não figurar entre as vinte primeiras já é um sinal de desprestígio. O PAC de Lula ainda não pegou. Não importa. O programa prometido pode vir a revelar-se vazio ou pífio, mas, se o PAC teve acolhida no discurso do presidente, no solene momento de sua posse, é porque veio para ficar. O governo vai jurar que ele existe, até o fim.

Extraído da revista Veja

* Jornalista e ensaísta

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