Tempestade de chuva e de política agropecuária - por Clídio de Moura Lima

Jornal O Norte
09/05/2007 às 11:10.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:04

Clídio de Moura Lima *

Claro era o dia numa tarde ensolarada, embora de ameno calor. E tudo corria bem, dentro da normalidade das terras da fazenda e de toda a região. Não se esperava chuva e de longe imaginar uma tempestade. As garças elegantemente faziam seu desfile soberbo e imponente, orgulhosamente se exibiam de forma vaidosa como lhes é peculiar ao redor do caudaloso e piscoso rio que corria mansamente. Chuva nem pensar.

O vento soprava languidamente, de mansinho, uma aragem refrescante para todos os bichos da fazenda. Nós, bichos outros, nos deleitavamos com a tranqüilidade do lugar: fazenda, bichos pastando, paz nos chamando à reflexão da vida. Ah! Se tudo na vida fosse realmente um mar de serenidade e amor... Ah! Por que não viver longamente com saúde, paz? (um pouco de dinheiro também não faz mal); e aos depois dos noventa anos de idade, lembrar que uns parcos janeiros nos restam: apenas mais vinte, trinta anos...  E não é querer muito!

Afinal de contas, de início, a mansidão do campo, do nosso sertão amado, nos faz acreditar na longevidade da vida, com a fé no Arquiteto do Universo. Pra que pensar em tempestade: chuva torrencial, procelas, clarões no céu como que rasgado por relampaguear repetitivo e atemorizante; melhor nem pensar e nada nos leva a tal pensamento diante do quadro harmônico do clima, como todos nós, animais irracionais e pensantes gostamos. As aves, os passarinhos desfilando ao longo, acima e abaixo do rio piscoso, sob um sol ameno e uma brisa refrescante e perfumada dos odores gostosos da mata. Viver, assim, apenas cem anos é pouco...

Você há de convir comigo! Que final de semana gratificante na fazenda do meu amigo e vizinho na cidade. Quem, quem poderia não desejar este belo fim de semana? Somente alguém que esta oportunidade ainda não teve. E o crepúsculo se avizinha, começa a chegar de mansinho... O sol ainda não se pôs. A luz do dia ainda clareia toda a mata; luz mitigada pelo ocaso. Começa um reboliço na mata. Uns cantos lânguidos, uns piados, bater de asas de som forte – é que os bichos iniciam a procura do seu lugar próprio para dormir; outros bichos se preparam para seus passeios noturnos; são os notívagos que caçam o seu sustento e subsistência... A paz reina na fazenda. O clima é bom.

Mas, por que o sapo começou a coaxar? Será para seu acasalamento? Por que alguns bichos começaram a mudar seu comportamento normal? O que se avizinha? Nuvens cinzentas começaram a se formar lentamente, mas de repente; o céu começa a escurecer e as nuvens cinzentas intimidam o sol que mais rapidamente procura refúgio no ocaso, retirando seus raios benfazejos da terra. O sertanejo velho, homem experiente, não vai perguntar ao sapo o porquê do seu coaxar e nem tampouco lhe pergunta o que está para acontecer. O sertanejo traquejado sabe! É chuva forte que está se formando e carregada, tudo indicando uma tempestade violenta e atemorizante. Que Deus nos acuda! Seja a chuva mansa, é o que desejam todos. E neste lugar, onde fica nossa fazenda quem quem temor não tem diante de uma tempestade?   Será mesmo uma tempestade?

Agora o sol se pôs. A noite veio depressa derramar seu véu; e no horizonte clarão, mais clarão... agora clarões mais intensos e intermitentes e se aproximando da fazenda e de toda a região. Estampidos de canhões ou rugidos de onças (leões por cá não existem)... Trovões! Trovões e mais trovões se ouvem antecedidos de relampaguear. Raios se precipitam dos céus para a terra queimando e incendiando algumas árvores. São clarões produzidos por descargas elétricas entre nuvens. São relâmpagos perigosos, rápidos e transitórios... Fulguram no meu sertão e a velha reza. Os bichos se amofinam e o homem reflete a vida: Grande é o Poder! A chuva cai. Não gotinhas mansas; mas torrenciais, chove a cântaros e a enxurrada se faz violenta e agressivamente vai derrubando, removendo, levando consigo tudo que encontra em sua frente. Corre rio, corre riacho, transbordam lagoas, tudo alaga, tudo é devassado e a chuva cai impiedosamente. Adeus minha plantação, meu pé de manacá, meu plantio de maracujá, minha doce cajá, tudo água abaixo, levada pela correnteza da enxurrada, do riacho e do rio, da minha mansa lagoa; tudo junto se fez um mar! Porém, como sempre, depois da tempestade vem a bonança, mais férteis serão as terras e novo plantio se fará. O sertanejo é acima de tudo um forte, para lembrar Os Sertões, de Euclides da Cunha. E acrescento submisso: um forte, teimoso e corajoso homem vivendo da esperança de melhor política agropecuária e pedindo chuva mansa para o sertão; e recomeçando a vida todos os dias. Olhai a labuta no campo, Senhor Presidente da República, Senhores Governantes e Exmos Legisladores do respeitável Congresso Nacional. Sem tempestade de chuva; mas, sim, com tempestade tempestiva de benesses, incrementando, fomentando e dando a merecida e necessária atenção ao setor primário da economia, subsídios e uma verdadeira e norteada política agropecuária dignificando o produtor rural. E viva o agronegócio.

* Advogado, escritor e professor universitário


clidiodemoura@yahoo.com.br

Compartilhar
Logotipo O NorteLogotipo O Norte
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por