Sorriso amarelo - por Raphael Reys

Jornal O Norte
Publicado em 15/03/2007 às 10:03.Atualizado em 15/11/2021 às 08:00.

Raphael Reys



- Os dados da visão e da audição trazem aos homens alguma verdade - Platão


 


Os habituais passageiros do ônibus urbano que passa e olham pela janela cristaleira, vêem uma cena de Dogging. Entediados pela falta de uma filosofia de vida, um casal de corações vazios faz um jogo de preliminares usando como palco o interior do veículo.



Exibicionismo e voyeurismo. Espetáculo muito comum na época do Império Romano, antes da queda. Trivial e simples em Sodoma e Gomorra desapertando a ira bíblica das potestades A intimidade e o mistério da sedução foi substituído pelo alto risco e pela adrenalina.



Falando das dores e do vazio da alma, o apóstolo Paulo afirmou: Como poderia eu não sentir sobre meus ombros o rude e sombrio peso das garras da tristeza.



O vigia da empresa comercial cruza as pernas. Cola o seu rádio portátil ao ouvido, denotando alheamento quanto à cena de Felline, que se desenrola a sua frente. Como operário da noite, ele já viu de tudo. Trabalhadores do turno noturno da construção de um prédio próximo se debruçam na ponta do beiral. Formam um quase andaime pingente.



À noite, com a onda de suavidade que lhe é própria, propicia a exteriorização da libido dos filhos de Vênus. Na esquina gira uma roda de gente no jogo da capoeira de Angola com animação e um calor suado, impulsionado pela vibração da corda e da cabaça.



Beijam as fitas no início do rito de abertura e batem palmas saudando os deuses da Mãe África.  cosi obá can, afí Olurum!



A pobre menina rica sai do carro e expressa um sorriso amarelo. Amarelo com transição para o tom esverdeado. Conseqüência da sua dependência exógena. A sua aura esta impregnada de resíduos obsessivos. Quando as sua alma-instrumento estiver fora do corpo, durante o sono irá vagar nos umbrais dantescos.



Lá, uma placa de néon adverte aos que cruzaram o portal: ó vós que aqui estais, perdei todas as esperanças.



O tom esverdeado, talvez seja um reflexo da sua bandeira, assim como é o amarelo pálido que lhe anima as faces. O seu carro é azul, quase anil. Por dentro uma zorra total!



Meninos de rua, pastores da noite cheiram cola. Logo mais, estarão também projetados fora do corpo físico e já no astral imediato encontrarão com a adolescente do sorriso amarelo. Cruzarão o Rio Estígio como passageiros do barco de Caronte. Ao desembarcarem, nem a divina Beatriz, nem o divino poeta Virgílio serão seus companheiros de jornada.



Conversarão com batráquios gigantes, mariposas com unhas coloridas, macacos executivos usando relógio Rolex. Andarão com botas de sete léguas. Verão Geppeto e Alice tomando sorvete de pequi com cobertura de mangaba, e usando como cone à casca do fruto do jatobá.



E como o Érebro é profundo e em círculos, e por mais chegar andando, da esquerda sempre e para o fundo; na parte chamada de Paratecas; viagem esta feita a cavalo, e com três dias de baticum e galope. Lá, o lendário Corjesuense de primeira água Pedrim de Araújo. Pedrim será visto procurando o seu cavalo de estimação, o Fenomenal, desaparecido há quarenta e seis anos... Atrás.

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