Sonhos - por Eduardo Lima

Jornal O Norte
Publicado em 12/04/2007 às 12:35.Atualizado em 15/11/2021 às 08:02.



Encontro o amigo escritor, dos tempos imemoriais dos versos sem motivo. Ele e sua companheira. A nova companheira, altiva, mais pragmática que ele. E fomos tecer sonhos. Ouvi-lo me apraz, dá-me parecer eu falando. Nem a lida, nem alguma irreflexão, nem as dores ou as tantas alegrias que se guardam em sua história foram capazes de afastá-lo dos devaneios; sonha ainda juvenil. Fiquei a ouvir e sonhar junto.



Conta o amigo que agora fincou pé e entusiasmado, alisados os cabelos pela menina de olhos vivos e mãos compridas, fazia desenhar com fala rica um cenário de luzes. Vão trabalhar muito e rápido, em poucos anos mais. Aí, vinda a aposentadoria, já terão edificado uma casa simples, porém nobre, arquitetada numa armação de cimento à vista, paredes brancas e no mais vidro, vidro e aço. Pé direito alto, espaço para o mezanino e atelier dela.



Mesmo espaço amplo em que se instalasse o computador para as suas aventuras pacíficas de escrever. Lá fora uma horta e umas bromélias e, claro, um lago pequeno e um fogão a lenha. A cozinha será no mesmo espaço, contou entusiasmado e ali mesmo, durante a prosa, fez uma farofa de ovo e bacon e contou um segredo culinário; o filé de peixe grelhado com vinho e ervas.



Tanto que na casa, que foi construindo virtualmente e com entusiasmo, haverá um varal no sereno, para a feitura das mantas de presentear amigos. Tal era a sua alegria que fui vendo, com nitidez, a casa e o casal, a remoer-se em felicidade, entre arrulhos e gestos de afeição. Ele tem filhos, ela não. Ainda não. Mas planejam dois, depois de uma viagem à Europa. Bem em tempo, já que não são meninos, embora ela seja mais jovem do que ele.



A casa, que eu já construíra inteira na minha visão mais encantada, a casa ficaria num terreno amplo, à beira de uma estrada secundária, no rumo de algum lugar. Sempre por perto, pois são bichos de luz, habituados a conforto e ar demais, sociáveis, cheios de amigos. Fariam, me disseram, piquenique na cidade. Viriam ao cinema e a livrarias, ao shopping e, no mais, veriam os amigos muito rápido, para não lhes permitir esquecer. Ela talvez comprasse tintas de pano, ou linhas, ou telas quem sabe, para desenhar buquês de hortências.



Ele leria poemas para uma platéia seleta e, logo após, se enfurnaria na casa para lamber os meninos e preparar pratos simples. E assim fomos falando um tempo pouco, eu sei, para que coubessem tantos sonhos. Sonhos possíveis, projetados com serenidade. Ao fim voltei à claridade da vida, à claridade quase ofuscante da vida. Menos tangido de questões de dor, mais disposto. Os sonhos são o alimento do homem.



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