Eduardo Lima
Encartada nos jornais do dia e distribuída nos sinais de trânsito, uma lista de promoção de medicamentos, anunciados por preços menores que os de fábrica. Independentemente de tratar-se de uma estratégia publicitária de especial efeito, uma vez que medicamentos, ditos tabelados fazem uma dança frenética quando o tema é preço, independentemente disso é provável discutir a relação que o país tem com medicamentos, ou drogas, como dizem os próprios médicos. Somos todos hipocondríacos, embora possamos repudiar esta desonrosa classificação. Sem contar que pagamos o olho da cara pela vida e pela morte, pois o remédio que redime é o mesmo que martiriza.
Tendo uma dessas listas na mão é que pude fazer observações. Uma delas é sobre o que se paga por remédio no país. Os descontos anunciados na lista promovem disparates de preços tão expressivos, que nos revelam a margem de lucros que se praticam no ramo farmacológico. Sem contar que nenhuma revenda de medicamentos ia oferecer produtos a preços mais baixos do que os pagos por simples gesto humanitário.
A variação proposta, a queda no custo final dos produtos, faz imaginar que anteriormente seus preços eram aviltantes e na oferta estariam mais próximos do real. Neste caso, melhor, pois haverá justiça e consciência no negócio uma vez que mais se beneficiariam os que fazem uso de medicamentos continuados, maior parte pobre e aposentada. Mas a tal lista - lida com especial atenção, pois me confesso hipocondríaco em grau leve - contém pérolas para análise. Primeiro porque faz ver o quanto de remédio já tomamos vida afora. Em segundo lugar revela a relação promíscua que temos com medicamentos; somos todos um pouco médicos e até receitamos, de forma aleatória.
Para qualquer sintoma temos a panacéia e diante da enfermidade alheia somos mais que médicos, somos PHD na matéria – comigo aconteceu a mesma coisa. Antibiótico é uma beleza e todo mundo conhece um, Sabe até o sal da fórmula. Para dor de cabeça um modesto repertório terá pelo menos dez itens. E assim desfia-se o rosário; lombalgia, dor no pé, dor de testa, pelo encravado, unha idem, dor de barriga, lágrima salgada demais, para tudo um de nós terá sempre um remédio ou o moço da farmácia, gente boa como ninguém, vai nos indicar o similar que é tiro e queda.
E ainda diante da lista surpreendo-me com alguns preços; tem remédio de mais de mil e trezentos reais. Mas há outros, afamados, que têm preço irrisório. Notei então, que o medicamento mais caro usa-se para emagrecer, parar de fumar e coisas nesta linha, que não significam exatamente a maior dor da população. Entre os pobres e miseráveis há, pela lógica, menos obesos, sobrando aí os subnutridos. Já os remédios mais baratos são psicotrópicos. Quanto mais afamados e poderosos, mais baratos. O que atesta, no miúdo raciocínio do cronista, que tais remédios custam menos por serem mais consumidos.
Diante da lista de medicamentos, encantado com sua gama de títulos, sua alucinante variedade, fui fazendo deduções leves e a que nada servem. Mais do que no corpo, a doença do Brasil é na cabeça, no pensar, no espírito, na alma. É doença mais grave, funda, improvável para a ciência. Crônicos, nós é que nos curaremos. Ou quiçá possamos viver enfermos. Mas sob controle.