Neumar Rodrigues *
Para quem não sabe, Santo do Pau Oco era como se chamavam as imagens talhadas em madeira cujo seu interior eram ocos. Muitas vezes essas imagens eram utilizadas para transportar o ouro de Minas Gerais, evitando ataques constantes dos saqueadores. Claro que a coisa não parava aí. As peças entalhadas e vazias por dentro passaram a servir de esconderijo ao ouro em pó e diamantes brutos, que assim saíam das áreas de garimpagem sem o ônus dos impostos pretendidos, seguindo direto para a Europa. De lá, elas retornavam ao Brasil recheadas com o dinheiro falso que os espertalhões de Portugal nos mandavam. A expressão Santo do Pau Oco sobreviveu à passagem do tempo e é empregada agora para identificar os hipócritas, os falsos, os mentirosos e os enganadores.
Seria, por assim dizer, uma pessoa que se esconde atrás de uma falsa imagem. Você aí, conhece alguém com tal perfil? Alguns brasileiros, como sabemos, são exímios praticantes desse lucrativo esporte.
Top, top, top... O gesto obsceno do assessor especial da presidência, Santo do Pau Oco Marco Aurélio Garcia, se inscreve na mesmo ordem de coisas que o “Relaxa e goza”, da ministra Santo do Pau Oco Marta Suplicy, com o qual compartilha a obsessão pelo ato sexual e a vulgaridade sem álibi dos bem-nascidos e bem instruídos. Tais manifestações de um governo revelam, no plano formal, o que eles pensam da nação. Mas seus conteúdos também são esclarecedores.
A ministra escolheu a linguagem do meretrício para dizer que os cidadãos devem renunciar aos seus direitos, inclusive ao de protestar, sublimando como fatalidade aquilo que ocorre das ações e omissões do governo. O assessor presidencial usou o mesmo registro para celebrar uma notícia que supostamente desviaria os olhares dessas ações e omissões. Esse homem pragmático da nova elite petista, certamente não se preocupa com os cerca de duzentos mortos e, como seu chefe, converteu a imagem pública do governo na sua prioridade absoluta. Mas essa é a moral dele, não a nossa. É preciso de uma nítida identificação de responsabilidades, que não se confunde com atribuição de culpa. Os culpadospela tragédia de Congonhas só serão conhecidos por meio de investigação técnica do acidente. Os responsáveis estão à vista de todos.
Os bombeiros ainda lutavam na tentativa de resgatar algum sobrevivente, quando o Santo de Pau Oco Marco Antônio Bologna, presidente da TAM, afirmou que o Airbus decolou de Porto Alegre “em perfeitas condições”. A mentira foi desvendada no dia seguinte: um defeito no reversor da aeronave havia sido identificado dias antes. Os passageiros freqüentes da TAM (assim como os da Gol) sabem que a mentira é a norma na relação das duas empresas do cartel dos ares com o público. Essas duas empresas mentem todo tempo, sobre horários, atrasos, cancelamentos e overbooking.
Agora se sabe que o presidente da TAM mente também nos assuntos de vida e morte dos passageiros de sua empresa. Bologna aprendeu que a mentira é a regra do jogo com o governo que protege o seu negócio fraudulento. Ao longo de quase um ano de caos aéreo, o governo se utilizou dos métodos reivindicatórios intoleráveis dos controladores de vôo para montar o que lhe pareceu ser o álibi perfeito. À sombra dos sargentos, tentou-se ocultar o aparelhamento político da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e da Infraero. A primeira se tornou cúmplice das empresas que deveria fiscalizar. A segunda direcionou os investimentos públicos para obras suntuosas e suspeitas, enquanto ignorava as necessidades óbvias de segurança de vôo.
Enquanto se procuravam os mortos, Lula permaneceu mudo. Quando, finalmente, saiu de sua toca, foi para oferecer um cardápio de promessas oportunistas, alinhavadas pelo propósito exclusivo de resgatar a imagem pública do governo. Ele mencionou a necessidade de investigar as “causas” do morticínio, mas não pronunciou uma única palavra sobre as responsabilidades do governo, da Anac, da Infraero e das empresas aéreas. O sonho dourado do Santo do Pau Oco Lula da Silva, nessa hora difícil, é suprimir a política, isto é, o debate público sobre a sociedade de interesses entre os órgãos do governo e as empresas aéreas que emoldura a pira de sacrifício de Congonhas. É um dever cívico frustrar esse sonho. Em nome da memória dos mortos e dos direitos dos vivos.
É preciso aumentar a produção do óleo de peroba para dar conta de tanta cara de pau!
* Jornalista