Reflexões sobre a velhice honrada

Jornal O Norte
Publicado em 28/09/2011 às 19:42.Atualizado em 15/11/2021 às 06:06.

Valdivino Pereira Ferreira (*)



A vida tem dessas coisas: é-nos oferecido a cada dia um confronto entre atitudes e acontecências que nos fazem refletir o nosso papel no mundo, no geral; e em nossa sociedade, em particular. Lançando meu livro Yeda Prates Bernis: Plenitude poética, em Belo Horizonte, tive a oportunidade impar de rever velhos amigos e os intelectuais mais representativos de Minas na atualidade. A própria homenageada, de família enraizada no norte mineiro, radicada especialmente em Montes Claros, cidade onde seu ilustre avô Camilo Prates desenvolveu intensa atividade política e partidária, é hoje considerada a maior poeta viva de Minas Gerais. Porém, ainda emoldura a sua figura humana com enorme dispositivo de discrição, elegância, cultura e finesse d’esprit, sendo que tais qualidades mais e mais agigantam a sua figura humana e dão dimensões colossais à sua poesia inata e transcendente. A sua lucidez psicológica e intelectual aliada ao extremo bom gosto pelas coisas do espírito faz de sua presença verdadeiro refrigério para aqueles que estão a sua volta. Em razão disso, todas as princesas da poesia mineira contemporânea estavam reverentes e felizes, juntamente com o Projeto Resgate Memorial, a prestar a vassalagem para a rainha mesopotâmica da poesia mineira.



Causou funda impressão em todos a presença ilustre do ex-governador Francelino Pereira, oriundo do nordeste, mas filho de alma e por escolha, da terra mineira. Convém que dele se fale. Filho do Piauí, donde veio imberbe para Minas em busca de melhor futuro, ele expressa em sua figura a boa gente daquele estado. Euclides da Cunha, o genial sociólogo / repórter da alma sertaneja brasílica, cunhou a frase “o sertanejo é um bravo”. Ouso dizer que o piauiense também. E o casal Venâncio e Maria Ana, simbólico conjugue parte de uma sociedade baseada em amor e respeito, bravura e honorabilidade, plasmaram em Francelino modelo acabado e bem-composto de homem: público, profissional e ser humano. “Dizei com quem andas, que direi quem tu és”, diz um velho brocardo latino que a poeira do tempo não consumiu nem embotou. Ao chegar em Minas, Francelino acercou-se e aproximou-se da claridade de homens do quilate de Milton Campos, Pedro Aleixo, João Franzem de Lima, João Lima Guimarães, Gabriel Passos, José Monteiro de Castro,


Bilac Pinto. Havia neles uma identidade que encantava Francelino, a unidade do pensamento que expressava a pregação udenista e plasmava o ideal bacharelesco na política. Sou pessedista temporão, porque nasci depois da morte do pessedismo clássico, mas reconheço a beleza da pregação e do ideal udenista. Porém, o que me encanta em Francelino não é a pregação udenista nem a plasmagem do ideal udenista, mas sim a diplomacia pessedista de que ele era e é dotado. Empreendeu um grande governo, quando o estado de Minas passou por terrível catástrofe natural devido às chuvas torrenciais, dando atenção especial a assistência social e a busca de soluções altas para problemas endêmicos e arraigados na política de Minas. Foi um governo de coragem, de visão e de respeito para com Minas e com os mineiros. Velho unido ao projeto que dirijo homenageando Yeda foi gratificante, porque do alto de seus honrados e bem vividos noventa anos e de sua magnífica lucidez intelectual, força-nos a refletir no valor real da terceira idade.


Pedro Maciel Vidigal, a quem eu devotava verdadeira amizade, dizia que aos músculos ágeis e fortes da juventude devemos as glorias olímpicas, mas é aos escaninhos mentais elásticos da velhice que devemos as conquistas intelectuais e espirituais. E o papa João Paulo II, de saudosa memória e reconhecida santidade, dizia sabiamente que “envelhecer com honra é uma graça, não um castigo”. Exemplos tais como Golda Meyer, Winston Churchill, Conrad Adenauer, Indira Gandhi e outros, devem ser creditados em honra da disposição cordial em relação a fraternidade universal e a cristalização da experiência acumulada virtualmente anos a fio.



Como disse Yeda, tenho que repetir: valeu viver a vida, pela emoção de viver esse momento. Ao refletir sobre a octogenária Yeda Prates Bernis e o nonagenário Francelino Pereira, ambos em plena forma intelectual, posso e quero afirmar que as bênçãos de Deus tem recaído sempre sobre as montanhas de Minas. Id est.



(*) Ensaísta, escritor e folclorista - Turmalina/MG


 

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