Nos anos 80, quando o teste de QI estava em moda e as grandes empresas passaram a utilizá-lo sistematicamente para contratar novos talentos, causou surpresas e fortes emoções à maioria dos candidatos preparados apenas para avaliações técnicas e de cunho acadêmico.
Na verdade o teste premiava muito mais aqueles que naquele momento utilizavam melhor sua inteligência, focava melhor a realidade, e desta forma obtinham o máximo de rendimento e concentração disponíveis, contrariando assim a expectativa geral, onde nem sempre a escolha recaia para o considerado melhor candidato.
Da mesma forma e retomando o tema de nossa nova série, o que se observa é que a felicidade encontra morada em espíritos mais simples, em corações mais humildes, em almas mais moderadas, em inteligências nem sempre tão brilhantes...
Na verdade, para entender um pouco deste assunto, é importante conscientizar-nos que a grande maioria dos nossos dias é absolutamente comum, sem grandes mudanças, novidades, acontecimentos memoráveis...
Dessa constatação podemos extrair uma primeira característica, qualidade ou habilidade essencial para a felicidade de qualquer ser humano, que é sua capacidade em valorizar seu cotidiano, apreciar a realidade, sensibilizar o que geralmente passa despercebido para a maioria das pessoas...
Você se encanta ainda com o som dos pássaros? Você ainda celebra e se comove com o alçar do sol quebrando a bruma do amanhecer? Seu sorriso de criança ainda continua o suficiente para te inspirar todo o seu dia?
Na medida que vamos perdendo nossa capacidade de emocionar diante do trivial, do rotineiro, do milagre diário do viver, do sorrir, do cantar, do trabalhar, do divertir, do relacionar mais necessitamos de sensações excitantes, o que fatalmente nos leva à depressão ou a procurar estímulos mais fortes nas drogas e na loucura...
A bem da verdade, se analisarmos com rigor a vida em si, a natureza, os astros, a própria respiração já é um verdadeiro milagre, prodígios grandiosos que se observarmos atentamente se repetem a cada instante, de forma exuberante ou microscópica, surpreendente seja com qual foi à lente que estivermos utilizando.
O segredo está em aproveitarmos o máximo às maravilhas do caminho em vez de ficarmos obcecados apenas com o destino.
No fundo, estamos todos nós em plena viagem temporal, única e insubstituível, e o que mais fazemos é desperdiçar a “janela”, a paisagem , os odores, os aromas os sinais de beleza que estão por toda à parte.
O aprendizado, o crescimento advém muito mais da nossa interatividade com a trajetória, com a estrada, do que propriamente com a estação, com a chegada, com o objetivo. Tem gente que nem se lembra o que almoçou... outros “engolem” a comida sem admirar as cores, os sabores que temperam o paladar da alma. Faça de sua “caminhada” um passeio, um encontro mágico com a natureza e os seus sentidos, uma celebração silenciosa do espírito em oração com toda a diversidade, gratuitamente recebida em vasta abundância.
A vida real fica longe e distante das novelas onde tudo se resolve e acontece no “último capitulo”!
Chegar a “sua” Santiago de Compostela com certeza será uma grande vitória, mas o mais importante serão os acontecimentos, os encontros, as emoções, as descobertas, os desafios, os medos, os aprendizados decorrentes do próprio “caminho” (e do caminhar...)!
Jesus há mais de 2000 atrás em uma de suas belas metáforas, já nos exortava a contemplar os “lírios do campo”, uma verdadeira recomendação profética com que o homem moderno se deixou capturar, fruto do stress, da ganância, da ansiedade e do imediatismo materialista.
Sob o velho slogan dos anos 70/80 de “São Paulo não pode parar”, a maior cidade do País sufocou suas áreas verdes, seus mananciais e hoje sofre as conseqüências dessa corrida maluca sem sentido, vitima do próprio veneno destilado anos a fio, sem lugar onde colocar mais tanta gente, tanto carro, tanto prédio, tanta poluição...
Não podemos deixar a nossa vida imitar aquele caixeiro viajante que entediado por percorrer sempre o mesmo percurso adormecia a cada nova partida do trem só acordando na próxima perada (estação).
A vida é uma dádiva, fornecida a “conta-gotas” pelo relógio do tempo que não para e não volta para trás.
A busca pela felicidade passa pela escolha crucial se queremos nos transformar num obcecado “tarefeiro existencial” ou com um toque de mágica nos tornemos um “artista ambulante”, a descobrir em cada detalhe do nosso cotidiano uma jazida nova, um olhar diferente, uma jóia rara, uma oportunidade, uma fonte inesgotável de inspiração e metamorfose criativa.
A mesma vida, os mesmos acontecimentos e desafios podem se tornar um “infeliz-arrastar-de-anos” sob o olhar do tédio, ou se transformar num painel brilhante, numa noite de gala, numa história inesquecível , um enredo fantástico, costurado em detalhes pela eterna magia.
Curta o seu caminhar... e seja feliz!