Marcelo Valmor
Professor universitário
Hoje em dia, praticamente em todas as cidades com mais de 250.000 habitantes, quando se tem um problema envolvendo a encanação, o telhado, a caixa de gordura ou a caixa d’água, imediatamente se liga para uma dessas empresas prestadoras desses serviços, e logo o seu problema está resolvido.
Mas em cidades menores, e Montes Claros já foi uma delas, sempre se recorria aos chamados “profissionais liberais”. Pedreiros, eletricistas, encanadores e “telhadistas” eram convocados, nos seus momentos de folga, para fazerem pequenos reparos nas residências.
Nos anos de 1970 quando a cidade ainda dependia desses trabalhadores para pequenos serviços, tive a oportunidade de conviver com alguns deles. Isso porque meu pai, que trabalhava o dia inteiro, não dispunha de tempo para resolver esses pequenos problemas, e eu, como o filho homem dentro de casa, era encarregado dessas coisas.
O primeiro deles foi João Macaco. Ele consertava qualquer telhado, ainda mais aqueles daquela época, todos feitos com telha francesa, e que tinham um encaixe incompleto, o que fazia com que a chuva - quando chovia -, invadisse a casa e colocasse as mulheres em polvorosa, já que camas, móveis e outras coisas manchavam-se, e, em alguns casos, apodreciam mesmo. E lá fui eu atrás de João.
Quando o encontrei, imediatamente o contratei para que fizesse alguns reparos no telhado da casa dos meus pais. Foi logo me dizendo que só poderia fazer o serviço se não estivesse chovendo, pois era perigoso. Eu retruquei dizendo que o serviço era para ser feito exatamente por causa dela.
Mas continuando a conversa. Ele chegou, escalou as paredes como um macaco, e quando me dei conta, olha o João no telhado. Foi logo gritando lá de cima: -Tem quatro telhas quebradas! Desceu, tornou a subir com telhas novas e deu o serviço por encerrado.
Outubro chegou, e com outubro chegaram também as chuvas. Meu pai olhava para mim e perguntava. – Me diga uma coisa, Marcelo, o apelido macaco é porque ele tem facilidade para subir no telhado? – Claro! Qual outro motivo teria? Respondi.
A tarde acabou e o tempo fechou. Chuva caiu aos montes. As goteiras, que eram duas, imediatamente se multiplicaram em umas dez. E diante do aborrecimento do meu pai, no dia seguinte procurei por João e lhe disse que as goteiras haviam proliferado por toda a casa. – Não entendi, Marcelo, respondeu ele.
Somente um certo tempo depois fui descobrir que, de fato, ele “consertava” telhados, mas o apelido macaco, na verdade, não era devido a sua habilidade para subir e consertar os mesmos, mas para roubar casas alheias. Aprendi que quando alguém tem mais de uma habilidade, uma ou complementa, ou prejudica a outra.
O segundo foi Alvino. Diante do caso do telhado, meu pai resolveu, ele mesmo, contratar um pedreiro para assentar uma janela em um dos cômodos da casa. Alvino chegou, fez uma lista de materias que precisaria usar, trouxe ferramentas aos montes, passou o dia na janela, tomou café, almoçou e lanchou, e, claro, assentou a janela.
Quando meu pai chegou do trabalho, fui com ele vistoriar o serviço do pedreiro. Só ouvi o meu pai dizendo para ele: - Alvino, essa janela tá de cabeça para baixo! No que Alvino respondeu: - O senhor acha seu Zé Paculdino?
Eu, em um canto do cômodo, não consegui segurar uma gargalhada.
Naquele momento nós descobrimos, meu pai e eu, que entendíamos de uma série de coisas, menos de contratar profissionais liberais para fazer pequenos reparos em residências.
A partir daí, qualquer conserto era dirigido a essas empresas especializadas e que davam garantias. Meu pai e eu estávamos empatados.