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A população mundial cresce assustadoramente e o ecossistema é gravemente pressionado. Humanos pervertidos pelo consumismo vagueiam cegamente rumo ao abismo, pois o ter que se sobrepõe ao ser hipnotiza a tentativa de reação. A ganância possui a vontade desesperada do querer supérfluo.
Os peixes vão sendo devorados pelos derramamentos de óleo nas águas no mar, o esgoto cai nos rios e consome o oxigênio, aumentando a angústia do pescador, que vê o pôr do sol com o olhar longínquo sobre as águas poluídas. Ele chora a perda do alimento e a chegada da fome, que traz doenças oportunistas que vão ceifando os ribeirinhos antes dos primeiros passos.
Pobre homem que desaba em prantos, sem recursos, nos ouvidos de Iara, que também está chorando, debruçada nos ombros do absorto caboclo d’água.
As florestas, na mesma saga, vão se perdendo na inconsciência, arvores centenárias se transformam em carvão e milhares de hectares de pastos vão aparecendo no cemitério das matas, onde cantavam pássaros e viviam em harmonia vertebrados e invertebrados, na comunhão do rei sol e da mãe lua.
Lá nas asas das harpas que se escondem além do olhar, Oxossi observa o vazio dolorido e deixa a natureza confundir as estações do ano. O homem, com o brutal capitalismo, não percebe que os seres que não se vendem possuem seus sentimentos em relação à existência que agoniza. Desta forma vem o trovão enfurecido zoar espantando as reses para o meio da ventania, que arrasta os restos mortais dos ipês amarelos, chocando-se com violência debaixo das gotas solidificadas da chuva.
A natureza que um dia foi cognominada infinita dá sinais de efemeridade diante de tanta maldade humana. A palavra extinção, que era termo quase restrito ao dicionário, hoje faz parte de conversas habituais, os animais raros estão desaparecendo e a captura predatória para o comércio é um dos grandes fatores. Outras espécies não conseguem mais se reproduzir, e na constância do perigo botam seus ovos e vão embora, com receio de serem atacadas no ninho. As tartarugas reagem no projeto Tamar, mas morrem asfixiadas ao comerem sacolas plásticas jogadas fora dos seus destinos e sopradas para as águas.
O santuário das Garças se transforma em cemitério, onde as linhas das pipas enganchadas nas árvores decapitam algumas e prendem outras, que morrem de sede.
Alguém tenta se levantar contra essa morte lenta da vida proporcionada pelo ser que se intitula racional. Entrega panfletos na praça e vocifera no descontrole do sol frio de agosto. Transeuntes em desdém lançam papéis de picolé, embalagens de guloseimas, enquanto fiscais de postura descem sem postura para incomodar os vendedores de caqui. E pouco à frente mais lixo rodopiando ao passar do lotação. Eis uma das desgraças da modernidade, algo que a sociedade industrial começou com a necessidade do descarte para a reposição lucrativa. E agora?
O lixo vai aparecendo como praga e as medidas de contenção vão surgindo com morosidade, esbarrando em burocracias estatais e interesses privados. A natureza, que vinha sendo destruída para o tal progresso, também vai cedendo parte do seu paraíso para a construção de lixões.
Cada pessoa produz em média de 500 a 800 gramas de detritos por dia. Isto aumenta nos países desenvolvidos, que são mais resistentes para aceitar a questão ambiental. O lixo também provoca acidentes: pela falta de separação adequada, os garis recebem em sacos comuns cacos de vidros, agulhas e seringas usadas em medicações caseiras, produtos exalando toxinas altamente prejudiciais à saúde. Também são encontrados em lixo comum, e hospitais e lavanderias recebem em suas coletas diárias de roupas infinidades de lixo que deveriam estar em outro destino. Com isto, perfuro-cortantes, vasilhames e até restos de amputações vão sendo desembrulhados, arriscando a integridade física de quem está nessa lida.
Certa vez, ainda criança, me contaram a história da Arca de Noé, o dilúvio, a fantástica embarcação que foi a responsável por recomeçar a vida na terra, com incesto e tudo mais. Fiquei com isto na cabeça martelando até o dia em que minha mãe me falou que da próxima vez o mundo acabaria em fogo. Foi mais uma assombração no meu pífio entender. Tempos depois ouvi que Jesus Cristo voltaria e arrebataria seus escolhidos, jogando os outros lá nos quintos do inferno, Enfim, tantas previsões nefastas do ponto de vista religioso demonstram que nossa novela não é como as da Globo, cujo final é medonho.
Mas, contradizendo tudo isto, está claro o fim do homem na terra. São indispensáveis as disposições anteriores. Acabou-se com a natureza, que é a fonte de sustentação da vida. Não vai ter como continuar respirando.