Raphael Reys
Jerúsia Arruda, subeditora de O Norte, passou-me um CD com um curta metragem intitulada O Sanduíche. E com o seu jeito doce e o seu olhar de Anay-Kondra fatal solicitou uma crônica sobre o mesmo.
Sem querer querendo, me deixou cheio de emoção! O CD, entretanto, não abriu. Fiquei a ver navios... Para não dizer que não falei de flores, falarei então sobre outro sanduíche, este mesmo que comemos no dia a dia. Às vezes, à noite.
Embora não pareça, esse artifício foi inventado pelos vikings. Eles mesmos, os conquistadores dos mares. Quando partiam para desbaratar novas fronteiras, levavam em primazia três coisas: o machado para romper, o escudo para se defender e o sanduíche para encher com moderação as suas grandes panças. Eram práticos!
- Homens carregando sanduíche embrulhado no bolso esquerdo e da frente da calça, o que pode ser visto como artifício erótico
O sanduíche vem então dos guerreiros louros, filhos de Odin, até o big mac dos dias de hoje. Esse conjunto de duas fatias de pão intercaladas com outras fatias de variáveis serve também como referência comparativa de preços de alimentos e outros objetos de consumo, no mercado internacional.
Embora seja prático como alimento e como objeto a ser transportado a coisas e lugares com os quais o mesmo, ou os mesmos, não combinam. Homens carregando sanduíche embrulhado no bolso esquerdo e da frente da calça, o que pode ser visto como artifício erótico.
No bolso de trás da calça sugere um pacuru ou, melhor, um naco de dinheiro, o que atrairia o farol alto dos assaltantes e punguistas que já dominam os Montes Claros. Mesmo à luz do dia e do descaso das autoridades ditas competentes, que a tudo observam de dentro do seu limitado globo campesino. São na visão cinematográfica do saudoso Victorio de Sica: Os Dons Camilos e os Seus Pequenos Mundos.
Contam os dias que passam por debaixo da ponte, de onde esperam as suas aposentadorias. O mundo é que se dane! O negócio é encher o pandu de cerveja, nos botecos da vida e fazer a mauvaise conscience do burquês.
- O único animal que come resto de sanduíche: sentado segurando decentemente o guardanapo de papel, e sem medo de ser feliz...
Ah, já ia me esquecendo. O sanduíche não vai bem com fatias de abóboras ou de morangas cozidas. Ficam com o sabor alterado. Não vai bem também com caroço de azeitona dentro. Já vi caboclo se engasgar, assim como cachorro pequeno comendo resto de sanduíche seco.
O único animal que come resto de sanduíche: sentado segurando decentemente o guardanapo de papel, e sem medo de ser feliz, são as ratazanas de praia de São Lúis do Maranhão. Importadas da Europa, desde a época do tráfico de escravos, se adaptaram e crescerem a tal ponto que enfrentam mesmo cachorro de porte médio. Dominam toda a área de portos da capital. Botam qualquer pessoa para correr!
Devo salientar ainda que o nome sanduíche é usado também em posturas eróticas, citadas no Kama-Sutrtra. Sagrada ciência da lascívia que os hindus nos deixaram como herança, e que nós na nossa secular malandragem tropical, adotamos como virtude máxima do ser dito masculino.
Não falei do seu curta metragem, por não tê-lo assistido, entretanto como o que você me pede rindo, eu faço até chorando falei do sanduíche mesmo, dos vikings até Kama-Sutra, na sua versão tropical. E viva Macunaíma. O herói de caráter dúbio, de Mário de Andrade.