Eduardo Costa
Vi na televisão uma reportagem sobre falsificação de cédulas no país e quase caí do sofá com duas declarações. O bacana do Banco Central falou que descobrir a nota falsa é fácil e só depende de “um pouco de atenção” de nós outros, cidadãos. O chique da Polícia Federal advertiu que quem recebe nota falsa deve imediatamente avisar às autoridades, para não se tornar criminoso. Francamente! Até parece que teremos sempre tempo, paciência e competência para olhar cuidadosamente a nota, de encontro à luz, descobrindo qual tem relevo, qual tem bicho... Brincadeira!
Por isso, gosto de um texto com o título acima que circula pela internet e que ousei resumir assim:
José foi assaltado. Assumiu a culpa pelo roubo: “Eu dei bobeira, não deveria ter parado naquele sinal”. Maria foi estuprada. Deixou clara a própria responsabilidade pelo episódio: “Vacilei, não deveria ter ido comprar pão sozinha”. Um ladrão arrancou o celular das mãos de João, e ele, João, assumiu total culpa pelo crime: “Não sei onde estava com a cabeça quando fui atender uma ligação no meio da rua”. Joana foi morta durante um assalto porque gritou. Foi condenada por todos: “Que estupidez dela ter gritado, todo mundo sabe que durante um assalto o melhor é ficar em silêncio”. Mário, policial militar, foi morto a tiros por traficantes. Os parentes o recriminaram duramente: “Ele sempre foi cabeça-dura, nunca quis esconder a farda quando voltava para casa”. Paulo, líder comunitário, foi esfaqueado pelos mesmos traficantes. Os amigos disseram: “Que falta de juízo, procurar a polícia para denunciar que o crime estava dominando o morro”. Marcos teve a loja assaltada e quase levou um tiro. Os empregados reclamaram:
“Que estupidez, deixar aquele monte de mercadoria exposta na vitrine”. Marcos passou a deixar tudo trancado em um cofre, a loja foi assaltada de novo, e um dos funcionários, após quase levar um tiro por ter demorado a abrir o cofre, agrediu-o violentamente: “Seu miserável, fica trancando tudo, mais preocupado com as mercadorias do que com a gente”. João estava jantando com a namorada em um movimentado restaurante quando uma quadrilha armada saqueou todos os clientes. O futuro sogro não gostou: “Esse rapaz é um irresponsável, sabe muito bem que não estamos em época de ficar bestando por aí, jantando fora, e acabou traumatizando minha filha”. Patrícia viajou a negócios. Desembarcou no aeroporto com o “notebook” e tomou um táxi. Foi assaltada em um semáforo. O chefe disse: “Você não poderia ter desembarcado sem antes esconder o ‘notebook’”.
De exemplo em exemplo, vamos chegando a uma verdadeira “rotina do absurdo”. No Brasil, é normal o cidadão ter medo de andar pelas ruas; é comum um policial não revelar a profissão, para não morrer; é usual pessoas pedirem permissão a traficantes para subirem em morros e é rotina abrir-se mão da cidadania mais básica... Tudo é tão normal que as vítimas estão se tornando culpadas pelos crimes.
