*Laura Conrado
Passei muito tempo da minha infância brincando de “assassino, detetive e vítima” com amigos do prédio e da escola. Lembro-me da palpitação que sentia quando, finalmente, recebia a carta para ser o detetive ou o assassino no jogo. Era chato ficar no papel de vítima: não havia nada a fazer além de esperar a piscadela do assassino e ficar quieta enquanto o jogo acontecia.
Se no jogo ser a vítima é entediante, na vida real algumas pessoas adoram sentar no banquinho dos injustiçados. Tive uma colega que sempre que alguém da turma desabafava, ela logo soltava uma história terrível no estilo das novelas mexicanas da Thalia, onde todo mundo perde um bebê. Ela chorava e dizia que estava deprimida, passando fome, que o pai estava desenganado pelos médicos, a mãe sem emprego e que nunca ousou nos contar seu drama para não nos atrapalhar. Essas crises sempre ganhavam força nas épocas dos trabalhos em grupo. Seja por pena ou para ficarmos livre da ladainha, isentávamos a bendita do trabalho e colocávamos o nome dela. Tornamo-nos vítimas da vítima.
E as tais crises de labirintite em momentos estratégicos? Quando uma colega teve apendicite e fomos visitá-la no hospital, a esperta desmaiou no quarto bem na hora da ronda. A pobre vítima superou a colega que havia acabado de sair da cirurgia e ganhou a atenção da enfermeira (que pensou estar ajudando).
E as vítimas que são artistas? Tecem comentários maldosos, difamam as pessoas e depois aplicam a incrível arte de reverter a situação a seu favor e saem como.... vítimas! Ah, se elas se empenhassem na vida da mesma forma que se esforçam para manipular, reclamar e chorar. Mas o banquinho de coitado, amaldiçoado pelo destino, parece ser mais quentinho.
Na vida, todos recebemos as mesmas cartas. Escolhemos por conta própria os papéis que vamos desempenhar. Você pode ser o juiz, o bandido, a mocinha, o carrasco ou a vítima; mas o fato é que as regras e as dificuldades são as mesmas para quem está vivo. Estamos todos no mesmo jogo.