Mara Narciso
Médica e acadêmica do curso de Jornalismo da Funorte
“O pai leva ao doutor
A filha adoentada
não come, não estuda,
não dorme, e não quer nada”
(Xote das meninas, Luiz Gonzaga e José Dantas - 1954)
Uma moça era magra e tinha grande dificuldade em manter o peso devido a uma peculiaridade: quando o namorado telefonava para o local onde trabalhava, ela começava a passar mal, com um enjoo que ia aumentando e só melhorava após vomitar. Era ouvir a voz da pessoa e o mal estar recomeçava. Custou a admitir que tinha aversão ao rapaz. Fez tratamentos, mas não ganhava um grama. Terminar o namoro seria o fim do problema?
Uma menina de seis anos chorava toda vez que via a irmã comer. Imaginava que ela estivesse passando por uma grande tortura. Mas a irmã comia feliz, e ela sim, é quem tinha inapetência em grau elevado, era magra demais e estava crescendo pouco, por falta de substrato. Os pais e avós faziam malabarismos para tentar enganá-la e fazê-la ingerir um mínimo de calorias necessárias para a sua sobrevivência. Já usaram diversas estratégias e ainda não conseguiram bons resultados. Inventam receitas, enfeitam as frutas e legumes como se fossem bichinhos, adulam, prometem coisas, ameaçam, dão gritos, e nenhuma melhora. Desistir não desistiram, mas continuam longe de uma solução.
Um rapaz de 18 anos dizia que se alimentava normalmente, porém media 1m85cm e pesava apenas 55 quilos. Vivia encolhido e encurvado por ser franzino numa terra onde os fortões são valorizados. Fez um enorme esforço para ganhar peso e, após muitos meses de musculação e estimulantes do apetite, aumentou 16 quilos e não mais os perdeu. Almoçava um quilo e meio em uma “bacia de alumínio”. Caso raro, dizem as pessoas antigas, pois “o calibre” da pessoa é aquele, e não há como mudá-lo.
Uma senhora idosa estava chateada porque tentava engordar e mesmo assim, a cada dia estava mais magra. Tinha pouco apetite, estava eternamente enfastiada, cheia de tudo, e para piorar, não sentia o gosto da comida tão bem quanto antes. Caso não forçasse a alimentação, fazendo um cardápio e o cumprindo rigorosamente, emagreceria até quase sumir. Em tudo colocava mel ou farinha, e mesmo assim não conseguia manter o peso. Quando jovem chegou a pesar 60 quilos, e agora estava com meros 45 quilos. Procurava comer de pouco em pouco, a curtos intervalos, principalmente alimentos líquidos ou pastosos, que são mais fáceis de engolir, e tentava esquecer dos problemas, sabidamente causadores de falta de apetite. Não se esquecia dos mingaus, das vitaminas (especialmente a de abacate, que é calórica e tem gorduras boas), dos engrossados, caldos, sopas, arroz-doce e canjica. Algumas vezes se sentia pior e era preciso bater a comida no liquidificador, tapar o nariz e engolir como se fosse remédio, já que nessas ocasiões era o único jeito de conseguir comer.
Todos sabem que mal de amor, paixão não correspondida, ou fim de casamento ou relacionamento são campeões em causar perda de peso súbita. Assim, antes de pensar em doença orgânica, é bom lembrar dessa possibilidade. Antigamente quando as pessoas viam uma mulher emagrecer diziam que “era fome, doença ou maltrato do marido”, já que é do conhecimento geral que amor desfeito emagrece.
Muita gente diz que engorda por ansiedade, mas o oposto também acontece, ou seja, emagrecer pela mesma ansiedade, pois esta faz sofrer, e com a expectativa o apetite some, a boca fica seca e amarga, surge um bolo na garganta, e é como se um sapo estivesse alojado nela. E aí não adianta insistir, que o alimento incha e não desce de jeito nenhum, nem mesmo com água. A falta de energia é total, sendo urgente comer, mas a pessoa não consegue. Não faltarão almas caridosas para alertar sobre a necessidade de ingerir algo, e dos riscos da desidratação. A pessoa sabe, mas não consegue se alimentar, e o peso vai só caindo.
Parar de comer devido à angústia, preocupação, stress, medo, abandono ou qualquer outro sentimento negativo, está longe de ser um fato raro, assim crianças que não comem nada, idosos sem interesse em comer e pessoas apaixonadas inapetentes são situações freqüentes. Essa outra face da moeda do distúrbio alimentar é bem menos falada, assim lhe faço justiça chamando a atenção para um outro pedido de ajuda: “não consigo comer nada”!