Dário Teixeira Cotrim *
Pesquisando no Livro da Lei Mineira de 1858, tomo XXIV, Parte 1ª, folhas 11, nós encontramos ali, a resolução de número 939, de (07) sete de junho de 1858 que aprovou o Código de Posturas da Câmara Municipal de Montes Claros de Formigas. Curiosamente alguns dos artigos inseridos no seu contexto nos chamam a atenção pelo simples fato de serem hoje considerados atos criminosos para o momento, pois esses artigos incentivam a extinção de animais silvestres como os tatus e pássaros pretos.
Há uma outra curiosidade. O belíssimo nome de Montes Claros de Formigas certamente que já nos oferece a idéia sobre a existência dos formigueiros em nossa cidade, não era simpático aos governantes de outrora. Nota-se que ‘formigas’ vem no plural e não no singular, eis aí a razão de tantos formigueiros na cidade. Entretanto, não sabíamos da existência de leis sobre o combate dos formigueiros, tanto na zona urbana assim como na zona rural. Parecem surpreendentes, mas havia uma grande importância em combater os formigueiros para o bem da ordem e do sossego público.
Em vista disso, no Título 5º sobre a ‘abastança de viveres’ e Capítulo 1º que rege ‘sobre a indústria’, vimos no artigo 144 a seguinte redação: “Todos os m oradores d’esta Villa, e seo termo, em cujos prédios houver formigueiros, são obrigados a extinguil-os, principiando pelos mais nocivos, e chegando ao conhecimento do Fiscal, que alguém é negligente no cumprimento deste dever, o advertirá, e não sendo atenda a advertência, será multado o contraventor em 2$000 réis, e o formigueiro será extinguindo à sua custa. Fora das povoações o fazendeiro só é obrigado a tirar anualmente, e nos meses de Agosto a Setembro, um formigueiro por cada quatro pessoas de serviço que tiver”. Entendemos que a eficácia da lei nunca seria uma determinante para a eliminação dos formigueiros, haja vista que até hoje elas passeiam livremente pelas nossas casas ainda muito a nos incomodar.
O Código de Postura da Câmara Municipal de Montes Claros de Formigas continua a sua perseguição aos formigueiros. Diz o artigo 145 do mesmo capítulo o seguinte: “Quando o prédio estiver abandonado, ou fechado, será o formigueiro extinto pelo Fiscal à custa da Câmara, e haverá depois do proprietário a importância do serviço feito-pena do artigo antecedente. Em qualquer dos cazos deste dous artigos, o Fiscal requererá ao Subdelegado licença para fazer examinar, havendo denúncia. No cazo que por podreza os proprietários não possão extinguir os formigueiros, não poderão impedir que os visinhos o facão, se a isto se propuzerem voluntariamente, debaixo da mesma pena do artigo antecedente”. Por aí se vê como é velha a luta contra a desobediência daqueles que não importam com os seus vizinhos. Hoje é necessária uma autorização judicial para invadir as casas abandonadas que servem para viveiros do mosquito da dengue. Naquela época as coisas eram diferentes.
Pasmem senhores! Entre outras medidas, no artigo seguinte do mesmo Código de Posturas encontramos uma “pérola” de redação. São obrigações impostas à população e que hoje elas são vistas como sendo atos de criminalidade a quem assim as pratiquem. Aliás, algumas coisas que eram licitas no final do século XVIII, agora no ano do seu sesquicentenário são atos criminosamente gravíssimos. Vejamos o que diz o artigo 146 do Código de Posturas: “Todos os lavradores deste Município são obrigados a matar annualmente cincoenta animais damninhos à lavoura, remetendo ao respectivo Fiscal as cabeças dos mesmos dentro do prazo de Setembro a Março – Multa de 2$000 réis, e o dobro nas reincidências”. A redação deste artigo continua da seguinte maneira: “Por animaes damninhos à lavoura entendem-se os tatus, capivaras, periquitos, maracanãs, maritacas e passários pretos”. Santa ignorância. No primeiro momento, para aquela época, esses animais pareciam que eram nocivos à população.
Mas, por outro lado era expressamente proibido a qualquer pessoa matar o Urubu. No artigo 147, parágrafo 2º deste mesmo Código de Posturas diz que “matar emmas, seriemmas e urubus: é contravenção e será punida com a multa de 1$000 réis por cabeça”. Assim era Montes Claros no ano de 1858, quando foi aprovado o primeiro Código de Posturas da Câmara Municipal.
* Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e de Montes Claros, e das academias de letras de Moc e Guanambi