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Terça-Feira,1 de Outubro

Memória de Montes Claros: Dona Tiburtina Andrade Alves

Jornal O Norte
08/06/2007 às 14:39.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:06

Dário Teixeira Cotrim *


 


O tiroteio do dia 6 de fevereiro de 1930, em Montes Claros, envolvendo os militantes da caravana dos Conservadores contra os da Aliança Liberal, precede o movimento político que veio pôr abaixo a Primeira República ou Velha República. Era a Revolução de 1930 que se iniciava em Montes Claros. Contudo, registra-se nos anais da história que esse movimento irrompeu no dia 3 de outubro e terminava no dia 24 do mesmo mês, com a deposição do presidente Washington Luiz Pereira de Souza e a dissolução da representação popular no Congresso Nacional. Em matéria de jornal, disse o jornalista Assis Chateaubriand que a cidade de Montes Claros fixa no momento culminante da consciência brasileira.

Por isso, podemos afirmar que a cidade de Montes Claros foi palco do primeiro episódio que antecedeu a revolução de 30.  Suas ruas foram invadidas por pessoas oriundas de Granjas Reunidas e também da capital do estado, eles que vieram fazer frente aos inimigos políticos do vice-presidente da República, Dr. Fernando de Melo Viana. Ora, sabemos que tudo isso aconteceu durante a visita de Melo Viana quando aqui esteve para participar do Congresso de algodão e cereais, evento elaborado com o intuito tão somente de fazer propaganda eleitoral em favor da candidatura de Júlio Prestes para presidente da República, quebrando assim a tradição da política do café com leite.

Por assim dizer, a política fervilhava mediante a paixão e o desejo dos militantes da Aliança Liberal em defender a integridade física do seu represente maior, o Dr. João José Alves. As ofensas que poderiam advir desses manifestantes – o que de fato ocorreu – representavam para o povo montes-clarense uma violência aos princípios políticos, os que se constituem na ética, na moral e nos bons costumes. Os mais exaltados certamente eram os jagunços do conde Alfredo Dolabela. Aliás, toda a comitiva representava perigo às nossas tradições políticas.

Nessa época, a cidade de Montes Claros dividia a sua política em duas facções distintas: o Partido de cima apoiado pela Aliança Liberal e que tinha como chefe o Dr. Honorato José Alves, e o Partido de baixo, amparado na concentração dos Conservadores, e que era liderado pelo deputado Camilo Filinto Prates. Segundo o historiador Henrique de Oliva Brasil, o objetivo maior do Dr. João Alves era o de prestar apoio ao seu irmão, o deputado Honorato José Alves.

Naquela noite, da Estação Ferroviária a comitiva descia para a região baixa da cidade quando, ao passar em frente à casa do Dr. João Alves, aconteceu o que ninguém queria que acontecesse. Na escuridão da noite, tiros de carabinas abafaram os gritos de Viva a Aliança Liberal! Na ocorrência policial, esses gritos foram dados pelo menino Austílio Benjarane Tecles, que era conhecido pelo apelido de Fifi, onde estaria a causa do tiroteio.

Depois do cessar-fogo foram contabilizadas as seguintes mortes: José Antônio da Conceição, João Soares da Silva, conhecido pela alcunha de João Gordo, Rafael Fleury da Rocha que era secretário particular do vice-presidente Melo Viana, dona Iracy de Oliveira Novaes, Moacyr Dolabela Portela e o menino, o Fifi, que era tão nosso amigo, segundo palavras da própria dona Tiburtina Andrade Alves. Escusado será dizer que dona Tiburtina, ao longo dos tempos ficou sendo injustamente a responsável pelos graves acontecimentos naquele final de noite.

O tiroteio em frente à casa do Dr. João Alves teve repercussão nacional. O presidente da República, Washington Luiz, preconceituosamente, deu-lhe o nome de Tocaia dos bugres, tachando assim o povo de Montes Claros de gente semicivilizada. O castigo veio a cavalo. Washington Luiz foi deposto e Getúlio Vargas assume o poder, que duraria uma década e meia.

Disse o saudoso escritor Geraldo Tito Silveira que dona Tiburtina é hoje uma mulher lendária como dona Beija, Joaquina do Pompeu, Maria da Cruz, Chica da Silva e outras, embora tenha sido muito diferente de todas elas, pois não se aproveitava de sua posição para mandar tirar a vida alheia. Tem razão o ilustre confrade na sua afirmação, porque a fama de mulher carniceira não lhe foi atribuída senão por vingança ou despeito.

* Historiador, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros e de Minas Gerais

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