Meio-passe não vale

Jornal O Norte
Publicado em 24/09/2008 às 10:22.Atualizado em 15/11/2021 às 07:44.

Márcio Adriano Moraes


Professor de Literatura e Língua Portuguesa


 


A cultura do meio é bem marcada, sobretudo, entre os jovens. A ponto de alguns estudarem, só para adquirir uma carteirinha que dá direito a meias entradas. Talvez, o sacrifício de estudar nem seja necessário, conhecendo-se um diretor ou diretora bonzinhos dá para se conseguir um carimbinho com uma rubrica, atestando ser aluno de escola tal. Agora, o meio estende-se ao transporte coletivo. Meio-passe para os estudantes. Os elaboradores do Projeto se aclamam por criarem uma política tão linda, e os que podem colocar a proposta em prática se louvam por acatar a reivindicação dos estudantes. Mas a proposta aceita, não foi a da política bonita; e o que a aceitou, fez isso bem tardiamente, depois de ter recusado muito, até “agredido” muito, em uma época de mostrar serviço, pois pode dar tchau a seu posto.



Não defenderei a aprovação do meio-passe, por mais que grande parte dos estudantes e da sociedade ache isso uma maravilha. Não julgarei errada a aprovação de tal política, ainda que fragmentada, pelo poder executivo. Racionalmente, restringir o meio-passe àqueles que possuem baixa renda seria o mais sensato. Mas, não, os criadores do Projeto querem estender a todos os estudantes, pobres, ricos, negros e brancos o direito ao meio-passe.



Se assim for feito há um pequeno problema. Se o meio-passe deve atingir a todos os estudantes, então que sejam todos os estudantes, ou seja, aqueles que estudam! E estudar não significa ficar trancafiado em uma escola. Não estou matriculado em escola alguma, mas estudo regularmente com meus amigos e em casa. Logo, sou um estudante. Também terei o direito ao meio-passe? Aquele trabalhador industrial que deixou a escola há muitos anos, precisa estudar com afinco o manual de sua empresa para exercer um bom trabalho. Bom, ele está estudando, terá direito ao meio-passe? Assim, a primeira coisa a ser feita é mudar o nome do projeto.



Outro ponto perigoso: se milhares de pessoas pagarão metade, quem pagará a outra metade. Com certeza, a doméstica dona Maria que tem que pegar dois ônibus para ir e dois para voltar do serviço. Ganhando um salário mínimo por mês, ela pagará a outra metade que o senhor Ricardo, universitário, que não gosta de dirigir e é dono de uma rede de comércio na cidade, não está pagando, porque é estudante. O aumento da passagem inteira será natural, já que as empresas perderão com o meio-passe. E alguém tem que pagar pelo prejuízo. E quem sofrerá com isso são os trabalhadores simples que usam o transporte coletivo. Seria, então, o meio-passe uma política benéfica para a sociedade? Privilegiar e massacrar, essa é a verdade do meio-passe.



Por que em vez de criar projetos segregacionistas como esse, não ousem atingir toda a população com medidas sérias e viáveis. Existem basicamente duas empresas de transporte coletivo na cidade. Abrindo as portas da cidade para que outras empresas possam atuar, haverá concorrência, e concorrência significa preços baixos. Se a prefeitura reduzir uma parte dos impostos pagos por essas empresas com a condição de diminuírem as tarifas, por exemplo, a população pagaria menos pelo transporte. Resultado, taxas baixas, sociedade pagando menos, pagando meio-passe, pagando a metade. Não só estudantes, todos os trabalhadores e desempregados seriam beneficiados. Isso seria um projeto, uma política linda que traria benefícios para gregos, troianos e montes-clarenses.



Não costumo andar de ônibus, mas tenho muitos amigos, trabalhadores, que labutam o dia inteiro, chegando a usar quatro conduções para irem e voltarem do serviço. Conheço também muitos estudantes “de escolas” que usam o lotação, e que possuem pais que pagam absurdos em escolas privadas; um vale a mais ou menos ou metade dele não faria tanta diferença assim.



A bandeira do meio-passe? Que ela seja substituída pela bandeira da redução das tarifas, dos impostos, pela livre concorrência. O que mais se vê nas propagandas de TV são lojas de eletrodomésticos fazendo promoções. Se não fizerem, o concorrente ganha. Aqueles estudantes de escolas que só badernam dentro da sala de aula não merecem o meio-passe. Mas aquele senhor que acorda bem cedo e vai para o seu bar preparar o tropeiro, merece sim o meio-passe, pois este ajuda mais a sociedade que aquele que ainda não possui consciência de sua importância nesta mesma sociedade. Viva o passe inteiro! Mas bem baixo! Viva a política para  todos! Meio-vale não vale!

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