Leitura sem censura: Porque é natal - por Adilson Cardoso

Jornal O Norte
Publicado em 20/12/2007 às 11:26.Atualizado em 15/11/2021 às 08:26.

Adilson Cardoso



O natal se aproxima. A data do consumismo vem chegando com seu andar manso e sua fome voraz. Vão comemorar o nascimento de Cristo, que nem mesmo a Santa Maria sabe que ele nasceu nesse dia. O vinho  vai jorrar como água de tempestade, entre todas as classes. Do Portal das Aroeiras ao Vilage do Lago lll, todos vão se embriagar, aqueles com um uma garrafa que o salário do mês com o décimo terceiro destes não compraria. Todos estarão imbuídos da grande festa do nascimento.



Vai tocar em todas as rádios a eterna Happy Christmas, de John Lennon, que morreu hã 27 anos. Também tem Simone, que traduziu a linda canção à sua maneira, e que tocará no carro de casais enamorados, no ápice da explosão espermática.



A Globo vai apresentar programas especiais e o piloto automático vai conduzi-los durante a madrugada. Quem ficar em casa que se dane, a televisão quer audiência. E tudo ficará bom, o pequi baixará de preço e quem tiver um real comprará três dúzias.



Porque isto é Natal.



Renan Calheiros vai mandar uma carta para você desejando-lhe boas festas. Porém, não adoeçam nesta época; deram um tiro na  cabeça da CPMF, e a ela está condicionada sua saúde, assim dizem os que nela deitam para  estuprá-la. Mas é natal, só isto é importante neste momento, principalmente para o comércio, que aumenta suas vendas. Brinquedos, artigos da mais fina pirataria, vales-transporte, roupas, preservativos, medicamentos para evitar ressaca e, claro, muita cachaça e cerveja e drogas e armas.



Não nos esqueçamos do movimento nas funerárias, que cresce devido aos aloprados motoristas e motoqueiros que se esbaldam na bebida para se divertir mais com suas fantasias despedaçadas nos salões dos IMLs.



O vizinho da sua esquerda, que nunca o cumprimentou, vai aparecer no seu portão com um pedaço de pernil da Maísa, atônito pela ação do álcool, e lhe dará um abraço com a mão cheia de gordura. O futebol estará de férias, quem  desconfiava dos jogadores da noite irá perdoá-los, como o jargão de uma personagem de humor:



- No natal, pode!



Deixem Adriano em paz, o ex-imperador da Internazionale quer tomar um gole e curtir a folia. Mas a terra está tremendo justamente na região do povo que treme naturalmente com a falta de qualidade de vida, no ano em que a seca devastou as plantações. Dizem por lá que o mundo está acabando, alguns até já se reúnem para rezar o terço da despedida. Jesus está voltando. Outros mais convictos, porém não menos fantasiosos, dizem que aquilo é o capeta queimando os pecadores... Sendo ou não, é natal.



Ainda tem o jogo de saias nos campos áridos da Várzea. Corpos musculosos que, no íntimo de sua subjetividade, se realizam nesse dia, levando a sério uma brincadeira de criança interrompida pela justificativa à sociedade.



Freud dizia que o desejo só acaba quando a pessoa morre, que ele é responsável pela energia da vida, assim chega o natal. Com suas iguarias formais e seus  paradoxos. E nós, vivos nesta esfera estratégica existencial, queremos agora, em uníssono, paz e esperança em todas as línguas e cultos. É o presente que precisamos trocar um com o outro.



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