Leitura sem censura - Hipocrisia e morte - por Adilson Cardoso

Jornal O Norte
Publicado em 17/03/2008 às 17:03.Atualizado em 15/11/2021 às 07:28.

Adilson Cardoso


adilson.airon@mail.com



Semana passada, fiquei estarrecido com a matéria que li sobre o assassinato de uma criança do sexo feminino de apenas 10 anos, ocorrido em um bairro da Zona Oeste da capital mineira. Chamava-se Ludmila e coincidentemente morava na Rua Universo em Desencanto. E quem a matou foi um jovem de 5 anos a mais que ela, ajudado por um desempregado de maioridade. Segundo os relatos, a menina era informante de traficantes rivais. Algo ainda mais cruel nessa tragédia é a falta de envolvimento dos pais na vida da criança. O despreparo para sustentar essa patente contribui diretamente para fatalidades desse nível.



A mãe da menina disse à polícia que havia dois dias do seu desaparecimento, mas a filha costumava fazer isto. Como entender? Se os pais não têm condições de zelar pelos filhos que estão  ainda na pré-adolescência, então precisamos mudar o foco. Vamos parar imediatamente com a hipocrisia de religiões que atacam métodos contraceptivos, em nome da proliferação da espécie que é vítima e algoz da sua própria decadência. 



É preciso que se criem mecanismos de avaliação da conduta de alguns pais, é inadmissível continuarmos assistindo feito vacas de presépio crianças sendo atiradas por janelas, dentro de lagoas, mortas a pancadas, violentadas sexualmente, vendidas e deixadas à revelia como sentimos no caso acima.



A democracia é a soberania exercida pelo povo, entende-se que a liberdade para a condução dos seus atos é prerrogativa, porém, a lei vem para garantir que não haja excesso nessa questão vivencial. Platão era contra a democracia, acreditava e defendia que o governo teria que ser regido pelos sábios. Podemos entender na questão em debate que, por serem pais, não deveriam ter o poder absoluto para reger os filhos, quando não possuíssem responsabilidade social, nem equilíbrio psicológico.



Para ser pai é preciso ser sábio como pregou o filósofo, ter entendimento e prazer em doar de si. Volto de novo à hipocrisia religiosa que vem agora investindo alto contra o aborto, mas ainda não investiu nada para ajudar a criar todas as crianças nascidas pelo fanatismo, aquelas que vieram porque os pais tiveram medo de pecar usando camisinha ou outro método que impedisse a gestação sem preparo.



Penso que o fato de dois seres se unirem para viver um sentimento não lhes dá o direito de trazer ao mundo uma vida sem a menor estrutura para se manter. O estado, que não age nesse controle inicial, mais tarde gasta com o aumento de abrigos para menores, cadeias e penitenciárias. Estudos recentes comprovam que, quanto menos alfabetizado é o casal, maior é o número de filhos. Pessoas que ganham em torno de  um salário mínimo têm o dobro dos filhos de quem ganha dez.



O antropólogo Augusto Salles comenta que, para os pais mais pobres, a questão futura é pouco discutida, vivem o agora com dificuldades, procriando sem planejamento, porque foi assim que foram criados. Até que se apareça uma luz para essa treva social, vamos chorando a perda precoce de meninos e meninas que ainda brincam de carrinhos e bonecas, pequenos astros que acabaram de ser apresentados ao show da vida.

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