Adilson Cardoso
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Enquanto aqui faltam poucos dias para conhecermos o novo ou o velho prefeito, no Paraíso a disputa continua acirrada. Após dois mil e oito anos no poder, o monarca Jesus Cristo, sofrendo pressões de diversas linhas partidárias, resolveu abrir o debate sobre a situação e deixar que outros nomes sejam apreciados pelos eleitores daquele lado da cortina da existência.
A oposição, liderada pelo prefeito fundador do inferno Lucifer do Capeta, está confiante na vitória, já que, segundo ele, o paraíso foi fundado pelos dois, e Jesus Cristo deu o golpe expulsando-o do lugar com o discurso de que houve subversão da sua parte. Coisa que não é verdade pois, segundo ele, queria apenas democratizar o lugar e implantar botecos e shows de strip tease.
Na época, uma junta de apoiadores chamados Fé e Tradição, liderada por São Pedro, Santo Antônio e São João, chegou a queimar projetos de evolução do paraíso na questão educacional, já que o modelo é considerado fechado e proibido de insinuar aberturas.
Depois disso, exilado no canto mais escuro de do outro lado da cortina da existência, Lucifer em profunda depressão, com febres convulsivas, queria se vingar e aquele lugar frio em que estava vivendo seria o mais quente de todos. Foi então que chamou Brasinha, um antigo colega de escola, que trouxe o gato preto e a bruxa, Desse dia em diante começaram a comprar caldeirões e tachos, como aqueles que tinha na Mafrel doces, e foram esquentando água, esquentando água e esquentando água...
Lucifer fez uma grande pá para mexer a água, que borbulhava, ele mexia, Brasinha mexia e o gato preto mexia e a Bruxa mexia... Chegou uma hora em que eles tinham tanta água fervendo que aquele frio lugar já estava mais aquecido que casa de lona preta que Tadeu ajudou construir no Coberta Suja.
Jesus ficou sabendo disso e resolveu criar um mito em cima daquela quentura: avisou ao Papa da Inquisição que quem não fizesse o que ele queria, iria queimar as nádegas eternamente no inferno, Aliás, o nome era Inverno, porque era muito frio, quando aqueceu virou inferno, mas nunca foi lugar de guardar alma dos mortos e a vingança não era vingança má, era apenas mostrar que ele tinha sido injustiçado e Jesus o traíra. Seria ali uma imensa liberdade, inclusive com direito à dança do créu e a sessões das Brasileirinhas.
Voltando às eleições, o que se vê em todos os lugares do outro lado da cortina da vida são adeptos dos dois lados com os nervos mais que excitados. Lucifer ganhou apoio de alguns ex-seguidores do monarca Jesus Cristo, entre eles São Cipriano e Judas Iscariostes, que se julga injustiçado com a sua alcunha de traidor.
O último debate no programa Além de todos os muros, da rede de televisão Já Era, deu novos rumos às tendências do eleitorado. Por exemplo, quando foi perguntado a Jesus Cristo por que é que ele matou os Mamonas assassinas, ele respondeu que era chegada a hora, recebendo muitas vaias dos cinco músicos destroçados em um avião.
O Capeta também teve seu momento de saia justa quando Jesus disse que ele estava usando disfarce, já que sua verdadeira cara era aquela que se parecia com um bode da capa do disco da banda Slayer. Com uma automática resposta, Lucifer disse que pior era Jesus, que nascera de pele morena e cabelos encaracolados curtos e se deixa passar por um loiro cabeludo dos olhos azuis.
Houve um princípio de tumulto quando o senador Antônio Carlos Magalhães, que foi expulso do Inferno quando ali chegou, disse que Lucifer fede enxofre. O guerrilheiro argentino morto na Bolívia, Ernesto Che Guevara, chamou Jesus de Maricon e sacou uma pistol. O padre cangaceiro Cícero acudiu com uma garrucha e soltou fogo. Virgulino Ferreira, que é afilhado do padre, passou a mão na carabina e deitou na tocaia. Lenin e Stalin esqueceram as rixas e foram para o lado de Che, juntamente com Saddam Russein e Tio Vicente.
Autoridades suspenderam o evento e prenderam os baderneiros. João Paulo II ainda tentou argumentar em defesa dos parceiros de Jesus e quase que também iria parar na cadeia. Arestas em combate, a guerra fria das eleições continua a todo vapor. Enfim, domingo é o dia e em qualquer que seja a dimensão o eleitor é o único capaz de mudar toda a história.