Leitura sem censura: Doutor Luciano Sena

Jornal O Norte
Publicado em 04/12/2008 às 10:14.Atualizado em 15/11/2021 às 07:52.

Adilson Cardoso



Montes Claros ora adiciona em seu rol de grandes vultos um incansável guerreiro de inteligência imensurável. Não que o seu trabalho pelo mundo já não lhe proporcionasse tal insígnia de grande historiador, que se envereda pelos mais inóspitos cantos a fim de descobrir os resquícios da resistência do povo diante do sistema. Falo com muita propriedade do doutor Luciano Sena,oriundo de escolas públicas das Montes Claros, leitor voraz de história e ferrenho defensor das causas do povo, com um imenso e recíproco orgulho. E agora Doutor pela Universidade de Kimberlley, na Carolina do Sul (EUA), com a tese A visão de dentro da Guerra de Canudos, onde afirma sobre inúmeros argumentos que o massacre contra o povo de conselheiro foi mais perverso que conta a história narrada por Euclides da Cunha em suas três fases.



Segundo o Doutor, que ainda conserva laços familiares no pacato Bairro Sumaré, por ser jornalista e estar subordinado ao sistema que queria a eliminação do Arraial de Canudos e a cabeça do seu líder, muitas passagens foram eufemizadas. Outra questão que creio será muito discutida é a afirmação de que membros da igreja se infiltraram entre os fervorosos sertanejos para facilitar o ataque  do exército no meio do austero sertão da Bahia, que os seguidores do beato conheciam muito bem, para caírem em algumas emboscadas, como conta Euclides.  



Comecei a conhecer seus textos de forte apelo social no ano de 1998, no jornal Candangos, da capital federal, muito elogiado pelo amigo poeta e filósofo professor Wagner Rocha, onde o professor de História Universal da UnB na época, falava sobre a trajetória de Antônio Dó, o justiceiro das barrancas do São Francisco, que fora comparado a Lampião, fato que com muito embasamento neste artigo, Luciano desmente e faz um fantástico paralelo entre as duas situações.



Em outra oportunidade o li no jornal Estado de Minas, desta feita sobre outro herói do sertão, de nome Saluzinho. Autor também do livro sobre a Guerra do Contestado com o título Peludos e Pelados, chumbo e fé onde fala sobre a postura truculenta  do governador da época, Vidal Ramos de Santa Catarina, no  ano de 1912, que considerava perigoso para o poder local o ajuntamento de sertanejos pobres em torno da figura do curandeiro José Maria, que pregava entre outras coisas a posse das terras que grileiros, a mando do latifúndio, tomavam e expulsavam os pequenos posseiros.



O livro explicita, escancara fatos que nos foram omitidos durante todo esse tempo. Por exemplo, da Coluna de trinta praças do regimento estadual que se dirigiu ao povoado catarinense de Taquaruçu, a mando do coronel Raul Rupp, com a ordem de atirar em quem não obedecesse a ordem de desamotinar. Mas os fiéis ao curandeiro resistiram. Assim começava a Guerra do Contestado que, em quatro anos, matou mais de dez mil pessoas, inclusive após a rendição em massa dos fiéis.



Houve a execução covarde das crianças denominadas As virgens de branco, que conforme  contos reunidos atestados pelas  testemunhas da época recebiam os poderes divinos para comandar o grupo e reacender a guerra em nome da fé.



Assim Montes Claros, que mesmo com tanta violência orquestrada pela droga e a falta de paz interior, ovaciona esse moço. Com residência fixa na Califórnia, quer esquecer o exterior e curtir o descanso na terra que tem gosto de dengo, e nada mais que sentir a chuva de dezembro cair sobre o cheiro de arroz com pequi e a deliciosa carne de sol.

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