Alberto Sena
Jornalista e contador de causos
Já contei que o meu sonho de ser jogador de futebol profissional não passou de uma tentativa amadora no juvenil do Casimiro de Abreu, em Montes Claros, sob a direção técnica de Bonga. Nessa ocasião, no auge dos 17/18 anos, era veloz, corria que era uma beleza. Ao ponto de entrar em êxtase.
Sim, em êxtase. Só que eu não identificava a sensação como ‘um estado de êxtase’. Sentia-me bem correndo e melhor ainda depois, como se tivesse comido uma porção de espinafre do ‘Popeye’.
Essa sensação eu sentia antes, muito antes, na época em que brincava de ‘esconder’ na Rua São Francisco e depois na Rua Corrêa Machado, em Montes Claros. Conseguia escapar de vários ‘pegadores’ ao mesmo tempo e ‘salvar’ os companheiros ‘detidos’ ao pé de um poste.
Recentemente, o jornal ‘The New York Times’ publicou matéria informando que um grupo de pesquisadores da Alemanha conseguiu comprovar a hipótese: correr produz ‘uma onda’ ou ‘uma sensação de êxtase’.
São as endorfinas, substâncias químicas do próprio corpo, comparáveis ao ópio. Segundo a publicação, correr não seria a única maneira de ter essa sensação de bem-estar. Exercícios mais intensos ou de resistência também podem levar o cérebro a produzir as tais endorfinas.
Voltando ao tema inicial: era ponta direita veloz e o técnico Bonga me chamava de ‘Homem Invisível’. Mas eu não chegava a ser tão invisível quanto o grande Raphael Reys diz ter sido em épocas que, embora tendo eu e ele vivido quase os mesmos acontecimentos, aí no Arraial, nunca havíamos nos encontrado, cara a cara, a não ser no ‘Almoço Curraleiro’ por ele promovido aqui nesses píncaros, almoço que degusto até hoje na lembrança.
Evidentemente, nos dias atuais, não mais disponho da capacidade de correr para fazer jus à alcunha dada por Bonga. Ando. E muito. Mesmo andando, experimento prazer. Talvez até maior do que quando corria veloz.
Ao contrário de antes, a consciência da importância de andar é maior. Exercitar o espírito, a mente e o corpo. Sentir o vento tocar o rosto e os raios benfazejos do sol na pele. Sentir-se vivo. E agradecer a Deus pela vida.
Andar é exercício completo. Há sem número de exemplos de idéias surgidas numa caminhada. Mas bom mesmo é fazer longas caminhadas. Principalmente em lugares de belas paisagens, quando se pode exercitar a capacidade de contemplar a natureza. Ao ponto de senti-la e dizer: ‘nós e a natureza somos um’.
O nosso planeta é lindo! Há lugares maravilhosos à espera de quem gosta de calçar botinas de ‘trekking’, pôr nas costas uma mochila, identificar no mato um cajado e andar. Fazer, por exemplo, o ‘Caminho da Fé’ – Tambaú (SP) entrar para Minas, subir e descer a Serra da Mantiqueira, até o Santuário de Aparecida, 400 km, a pé – é algo inesquecível!
Assim como é também inesquecível percorrer o ‘Caminho de Santiago’, desde San Jean-de-Pied-Port, no Sul da França, até a cidade de Santiago de Compostela, na Espanha, 800 km, a pé. Para alguns, ‘uma loucura’ para outros, ‘uma façanha’.
O peregrino recomenda a quem se dispuser a fazer esse tipo de caminhada logo na primeira oportunidade. Tudo começa a partir do desejo. Se se tem o desejo de, por exemplo, percorrer o da ‘Fé ’ ou o de ‘Santiago’, a pessoa já pode se considerar a caminho. E que não deixe passar a oportunidade.
Se muitos andassem mais, deixassem em casa os carros, teriam saúde para dar e vender; seriam mais felizes; o trânsito de Montes Claros melhoria, até mesmo sem a intervenção do urbanista Jaime Lerner. Embora uma coisa não tenha a ver com a outra.
Quem anda faz reflexão, faz oração, contempla, tem mais tempo para observar o que está em volta. Não se estressa tanto quanto quem vive ao volante. Andar não polui o ambiente.
Aqui, neste Curral Del Rey, um dos pontos mais próximos e bonitos para uma caminhada salutar é, de um lado, o Parque das Mangabeiras; e do outro lado, o Parque Paredão da Serra do Curral.
Do alto da Serra do Curral se pode ter a clara visão do Cerrado, o Sertão de Guimarães Rosa; e a Mata Atlântica, do outro lado. O mais incrível é que pequizeiros são encontrados lá em cima. A prova cabal de que a Serra do Curral é de fato um divisor de ecossistemas.
Andem, pois.
De passo em passo se chega ao longe.