Ronaldo Duran
Romancista, contista e colabora com crônicas toda semana neste jornal.
ronaldo@ronaldoduran.com
As vassouras alojadas num canto. Tiveram que se desdobrar para limpar salas, banheiros, corredores. Até as plantas, após aguadas, agradeceram. As três amigas, na copa, proseiam futilidades. Amanhã é dia da independência. Amam o país, mas estão longe dos ideais de civismo. Ir ao desfile militar? Nem pensar. O programa de feriado no máximo contará com um churrasco ou lasanha para almoço com a família.
A indesejada parada militar alimentou a prosa. Uma recordou o tempo que desfilava pela escola primária. Aquele tempo sim, dizia a loira de olhos azuis, era bom. Hoje em dia as escolas não valorizam as datas importantes. Os alunos? Se a escola não dá o exemplo, mostra o caminho correto, como quer cobrar postura.
“É tempo moderno”, rebate sorridente a negra, a mais nova das três. A terceira faxineira, morena, cabelo negro escorrido e longo, a mais gordinha, não fica atrás: “Tenho pena de minha filha. O que vai sobrar para ela? E para meus netos?”.
Seguindo a lógica da frivolidade, a conversa de repente se torna séria. Está sob análise a conduta dos homens. A loira de olhos azuis e de cara amassada pela árdua vida reclama a conduta do genro. Moço pouco ambicioso, muito dependente.
“É assim que eles estão hoje”, emendou a loira, “exploram como podem as mulheres. As vítimas preferenciais são as de meia idade, com casinha no nome. O malandro se achega e quando se dá conta está ele no sofá, comendo e bebendo. Uns deixam de trabalhar. Comigo não, jacaré.
“Você tem toda a razão. Minha amiga é que está passando um sufoco com o namorido”, a negra acrescenta.
“Eles acham que é só fazer isso”, e fez um gesto obsceno, “pensam que fazem favor no carinho que dão e justificam a exploração da pobre coitada”.
“Eu sou sozinha, e comigo não”, defende-se a morena, “posso muito bem viver sem amor. O que não aceito é ser explorada. Se quiser somar comigo, ótimo. Ter que lavar cueca de marmanjo e agüentar marido grosseiro? Nunca. No fundo eu tenho pena delas: que para manter o marido, fazem de tudo.
As amigas continuavam a prosa, convictas nas manifestações de repúdio à exploração da mulher por um homem que a usa, por medo de ficar sozinha.
“Os homens de antigamente, sim, eram de verdade”, dizia a loira. “Eram sim”, as demais concordaram em uma única voz.