Antônio Augusto Souto
Raramente vou a supermercados: lá em casa, leitora, quem se encarrega das compras necessárias é a patroa. O máximo que me concedo, em tais ocasiões, é esvaziar o carro, depositar, aleatoriamente, sacolas de plástico em mesas e balcões e reclamar da trabalheira a que sou obrigado. Com prazer, deixo para ela a incumbência de desembalar, selecionar e guardar o que comprou e pagou, com adicional do meu cartão ou com cheque da minha conta e/ou.
No entanto, quando viajo, gosto de visitar supermercados grandes. Não necessariamente para comprar. Visito-os para namorar as prateleiras de bebidas importadas, Quando a sedução fica irresistível, peço autorização à patroa e compro qualquer coisa, seja para uso próprio, seja para presentear algum amigo que, acaso, tenha feito por merecer.
Dia desses, por exemplo, comprei garrafa de rum cubano, com o pensamento em daiquiri.
Por falar na bebida que Ernest Hemingway adorava e se houver algum prezado leitor interessado em conhecê-la, dou-lhe a receita: uma dose generosa de rum carta branca, suco de um limão taiti, uma colher de café de clara de ovo bem batida, açúcar ou adoçante a gosto e gelo picado. Bater, na coqueteleira, servir em copo médio, decorar com um raminho de hortelã se quiser. E beber, com moderação.
Logo que retornei a este sertão que amo, tratei de usar o rum que comprara. Para minha decepção, o drinque ficou horroroso, pois me esqueci de um pormenor decisivo: quase todo rum que é produzido na ilha de Fidel Castro é “añejo”, quer dizer, anisado (contém anis que, por acaso, é erva doce), para desestimular que seja misturado com Coca-Cola. Tio Fidel tem lá suas razões. A conhecida cuba-libre nasceu nos Estados Unidos, no início dos anos 60, e foi inventada pelos cubanos dissidentes que moram lá.
Como estava a fim de fazer um brinde ao autor de “Por Quem os Sinos Dobram”, repeti a receita, usando Bacardi, que é produzido no Brasil mas tem origem em Cuba. Aliás, a aguardente destilada do melado de cana é típica do Caribe. Como é típica do Brasil a cachaça, que é destilada do caldo de cana devidamente fermentado.
Com a nossa cachaça, fazem-se caipirinha e batida. Diferença: na primeira, usa-se o limão amassado; na segunda, suco. Para os apreciadores tanto da caipirinha quanto da batida, a cachaça não pode ser envelhecida ou ter cor. A ideal é a branca e nova, sem cheiro ou sabor de bálsamo, umburana ou outra madeira qualquer.
Nesta altura, leitora querida, devo fazer um parêntese: não sou um bebedor contumaz. Tenho minhas limitações. A capacidade hepática não é lá essas coisas. Há, ainda, o policiamento do bom senso, da vaidade pessoal e da patroa.
Feito o parêntese, retomo o assunto, para encerrá-lo.
Como o brasileiro é particularmente criativo tanto que pôs gelo no uísque (ou uísque no gelo) da caipirinha derivaram-se a caipiríssima (com rum) e a caipirosca (com vodca). Em Salinas, há até uma cachaça “añeja” (com erva doce, como falei, linhas atrás) bem palatável, como me contaram.
Acabo de saber, por intermédio do Pereira (meu ótimo amigo novo) que o rum ideal para se fazer daiquiri é o jamaicano. Na próxima viagem, vou ver se consigo encontrar. Depois, escrevo outra crônica, leitor, e lhe passo a minha opinião.
Saúde!