Manoel Hygino
Edmilson Caminha, a quem já se devem bons livros, surge agora “Com a mala na cabeça”, um precioso volume de crônicas de viagem. Suas experiências e aventuras pelo mundo afora nos servem para conhecer ou reconhecer mais intimamente lugares visitados e personagens focalizados. Tudo de maneira muito agradável, pois em linguagem corrente, de modo a que seus registros possam contentar todo público.
Começa a série de descrições com uma viagem à Antártida e as impressões que trouxe do Polo Sul. É útil saber como vivem os brasileiros que operam na Estação Comandante Ferraz, realizando pesquisas científicas, enquanto assistem ao espetáculo de pinguins e focas em um lugar com 30 milhões de metros cúbicos de gelo.
Mas isso é apenas o princípio, porque a partir dali, relata-se percurso de Caminha ou sua passagem pela Tunísia, Peru, França, México, Argentina, Portugal, Alemanha, Israel, Egito, Grécia, Cuba, Rússia e China, se não faltar algum país mais.
Percorrendo partes belas do mundo – qual não tem beleza e atrativos? –, o autor focaliza os seus filhos ilustres, estadistas ou artistas ou intelectuais, assim como o anônimo habitante do país, com suas alegrias e necessidades, seus sonhos e temores, dificuldades, costumes, sua existência enfim.
É uma descrição vívida de momentos inesquecíveis. Caminha diz bem, ao almejar “que as crônicas reunidas em ‘Com a mala na cabeça’ sejam o testemunho, despretensioso e honesto, de quem viaja não apenas para comer, beber, rezar, mas principalmente, para viver a bela experiência da solidariedade humana, de espírito fraterno, da paixão pela literatura e do amor à arte”.
O passeio se faz também pela Holanda, para apreciar Amsterdã e comover-se com a criação genial de Rembrandt, ou com a casa em que Maurício de Nassau residiu, em Haia. Em Viena, na visita aos museus, sob a neve que cai, a volúpia de sentir de perto a obra de Klint ou os nus de Egor Schilele.
Curiosa visita é aos esgotos de Paris, que evocam as meditações de Victor Hugo, em “Os Miseráveis”, ao contatar que o esgoto é a consciência da cidade, para onde tudo converge.
“O esgoto é um cínico. Ele diz tudo”. Os primeiros 30 quilômetros do sistema datam do século 19, sob Napoleão I. Pequena parte é aberta à visitação, à tarifa de 4,30 euros. Os ratos são amigos, importantes para administração da rede, percorrida diariamente para inspeção. Mas também é possível se encontrar alguma joia de valor.
A viagem a Israel é evocativa e bela. A região, que serviu de berço a religiões, mas também continua palco de conflitos tenebrosos, desperta pensamentos e sentimentos, alguns certamente transcendentais.
Uma excursão ao Sinai, via deserto, serve de liame dos dias atuais a 3.500 anos atrás, quando Moisés recebeu do Senhor as tábuas da lei. Poder-se-ia vencer a distância e seus inconvenientes em camelo, ao custo de “ten dollars”, mas o viajante brasileiro preferiu ir a pé, “mais que à procura de Deus, caminhando ao encontro de si mesmo, da fé”.
