Dário Cotrim

“Minha roça, Meu paraíso”

Publicado em 06/01/2023 às 22:23.

Prefaciar o livro “Minha Roça, Meu Paraíso”, da memorialista Silvia Assunção Oliveira, foi, para mim, um momento de muita emoção, quando evocamos da vida a alegria de viver e, de sua obra literária, o prazer da leitura.  

Para os descendentes do saudoso Almerino (ou Seu Merino) e de sua esposa, dona Marilene, este livro de reminiscências é um tropel de exasperados sentimentos, pois tudo nele está presente, o costumeiro viver de um povo simples, bom e ordeiro.

A autora soube, como ninguém, prosear os causos de seus pais com a maestria de quem, também, sabe contar histórias para ninar, pois sabe ela que o amor começa no lar, ou pelo menos assim deveria. Em vista disso, ela nos conta que ouviu todas as histórias de seus pais, relembrando os momentos bons que juntos passaram naquele lugar aprazível. Portanto, falar das coisas já passadas lá na sua saudosa Itaipava, é a melhor das conversações avelhantadas neste livro.

Com ênfase para a prática dos labores campesinos, este livro revela, através de uma linguagem clara e acessível, a labuta de uma família cristã, preocupada em criar os filhos com o trabalho do garimpo e a plantação de roças. Toda a narrativa aqui verificou-se na fazenda Itaipava, no município de Diamantina, no alto rio Jequitinhonha. É uma história fantástica que merece a atenção de todos.

É, talvez, por isso mesmo, que Silvia resolveu escrever este belíssimo livro de reminiscências, onde ela registra os afazeres e os saberes de seu povo nas barrancas do rio Jequitinhonha, na roça cuidando das lavouras de subsistência ou, nas horas de lazer, contando as assustadoras histórias de assombrações para os pequeninos. Era comum, no trajeto da procissão fúnebre, as almas do outro mundo jogarem pedras nas pessoas que conduziam o defunto para a sua última morada, no cemitério de Curralinho. Pedras que não se sabe de onde vinham e nem quem as atiçava, um mistério que já dura séculos. 

Hoje não se vivem, verdadeiramente, os que não gostam de dar uma boa prosa com os amigos. Destarte, o seu Merino profetizara relatos sobre os causos do “homem-misterioso”, ou da “cabaça-que-rolava” pelo caminho em busca da cachaça, isso sem falar no “fantasma gigante de um olho só”.  

Aliás, essa história curiosa do “fantasma gigante de um olho só” nunca teve seu fim e lembra-nos outras histórias recheadas de fantasia no mundo da imaginação. Nota-se, prezado leitor, que este livro “Minha Roça, Meu Paraíso” é um apanhado de reminiscências. A autora sempre procurou o caminho, guiada pelas suas lembranças, aspirando o desejo de uma confidência com a natureza.  

É preciso, também, ter bem em mente que o seu texto possui o sumo de um fruto silvestre, assim como o perfume das coloridas flores do campo. Nesse caso as suas memórias, principalmente dos seus entes queridos, são nostálgicas e nos causam um sentimento de consternação e prazer.  

Numa homenagem simples e bem oportuna, a autora faz da canção “Meu querido, meu velho, meu amigo”, de Roberto Carlos, a sua mensagem de amor, ternura e saudade, pelo encantamento de seu Almerino. E ainda completa dizendo que “a sua partida, meu pai, deixou em mim um vazio tão grande no coração”!

Feliz quem pode, em linhas gerais, produzir um livro de doces reminiscências para os seus descendentes. Feliz quem pode viver e conviver com as lembranças de um tempo, sabidamente, que nunca mais irá retornar. Pois bem, feliz é a escritora Silvia Assunção Oliveira que tem no coração o retrato de uma época bem-aventurada de sua vida. 

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