Wendell Lessawendell_lessa@yahoo.com.br

O educador como servo da verdade

Publicado em 17/09/2025 às 19:00.

Num tempo em que a educação se tornou um dos campos de maior disputa ideológica e cultural, repensar o papel do educador é uma tarefa urgente. A figura do professor, que por séculos foi sinônimo de autoridade moral e formadora de consciência, muitas vezes se vê hoje no centro de tensões entre pais, governos, instituições e movimentos diversos. A pergunta que emerge com força é: o educador deve ser um agente de transformação política, um transmissor neutro de conteúdos, ou um doutrinador de causas específicas? A tradição bíblico-reformada nos oferece uma alternativa robusta e atual: o educador é um servo da verdade, um instrutor na justiça, alguém que ensina com temor, consciência e compromisso com a formação integral do ser humano.

Essa visão começa com uma convicção essencial: a verdade existe. Em um mundo relativista, onde a verdade é frequentemente tratada como construção social ou instrumento de poder, a cosmovisão bíblica afirma que há uma realidade objetiva, criada por deus, sustentada por sua Palavra e acessível à razão humana, ainda que limitada. O educador, portanto, não cria a verdade — ele a descobre, a estuda, a comunica com fidelidade. Ele não é senhor da consciência do aluno, mas guia que o auxilia a trilhar o caminho do discernimento. Seu compromisso não é com slogans, partidos ou ideologias, mas com aquilo que é verdadeiro, justo e digno de confiança.

Nesse sentido, o apóstolo Paulo, escrevendo a Timóteo, oferece uma definição clara da função do mestre cristão: “toda Escritura é inspirada por deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2Tm 3.16–17). A tarefa do educador, portanto, é educar na justiça. E isso só é possível se ele estiver disposto a se submeter a um padrão superior, que o transcende. A educação não pode ser reduzida a adestramento técnico, tampouco pode ser sequestrada por agendas militantes que confundem ensino com catequese ideológica.

A tradição reformada, especialmente desde a Reforma do século XVI, sempre enfatizou a importância da educação como parte da mordomia cristã. Reformadores como João Calvino, Martinho Lutero e, mais tarde, figuras como Abraham Kuyper, compreenderam que ensinar é um ato profundamente espiritual, pois envolve moldar o coração, a mente e a consciência. Mas essa moldagem não deve ser feita com violência simbólica ou manipulação afetiva. O verdadeiro educador não força a conformidade — ele convida à reflexão, apresenta argumentos, promove a responsabilidade moral e ensina a pensar com clareza. Ele não confunde instrução com militância, nem disciplina com opressão.

A cultura contemporânea, porém, tem colocado sobre os ombros do educador demandas que vão além de sua vocação. Espera-se que ele corrija as falhas da família, substitua a figura dos pais, cure feridas emocionais e, ao mesmo tempo, transforme a sociedade segundo determinados projetos políticos. Muitas vezes, o professor é pressionado a ser um “agente de mudança”, mas a mudança que se espera não é o amadurecimento do aluno, e sim a adesão a uma pauta específica. Isso desrespeita a liberdade de consciência dos estudantes, a diversidade legítima de perspectivas e, sobretudo, o papel do educador como formador de caráter e não como propagador de slogans.

O educador justo é aquele que respeita o tempo do aluno, que reconhece suas limitações, que ensina com paciência, que corrige com amor e que conduz com firmeza. Ele sabe que formar um ser humano não é o mesmo que fabricar um militante. A tradição bíblico-reformada insiste que o conhecimento é sempre vinculado à sabedoria e ao temor do Senhor (Pv 1.7). Isso significa que ensinar exige humildade: ninguém ensina bem se não estiver disposto a ser ensinado. E ninguém forma outros se não estiver sendo continuamente formado pela verdade.

Na prática, isso exige que escolas e universidades sejam espaços de liberdade responsável, onde perguntas sejam bem-vindas, onde a diversidade de ideias seja tratada com honestidade e onde o compromisso com a verdade não seja sacrificado em nome da conveniência cultural. O educador cristão, ou qualquer educador influenciado por essa ética, não deve esconder suas convicções, mas tampouco deve usá-las para manipular ou dominar. Ele ensina porque ama, e ama porque compreende que todo conhecimento é dom e toda vocação é serviço.

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