Nos últimos anos, um fenômeno doloroso tem-se intensificado ao redor do mundo: a perseguição religiosa, especialmente contra os cristãos, que continuam a ser alvo de discriminação, violência e repressão em diversas partes do globo, como foram os judeus em outras épocas. Quando refletimos sobre esse cenário, é impossível não lembrar as palavras de Jesus, registradas em Mateus: “Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, pois deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós” (Mateus 5.10-12).
Esses versículos, conhecidos como parte do Sermão da Montanha, revelam um paradoxo que desafia nossa lógica humana: a bem-aventurança de ser perseguido por causa da fé. Essa afirmação de Jesus não é uma chamada à passividade ou a um masoquismo cristão, mas uma orientação sobre como devemos compreender o sofrimento e a violência que, infelizmente, fazem parte da história dos cristãos ao longo dos séculos e continuam a ser uma realidade diária para muitos em diversas partes do mundo.
É importante destacar que, ao falarmos sobre as perseguições aos cristãos, não estamos nos referindo a eventos isolados ou a fenômenos do passado. As notícias de ataques a igrejas, assassinatos de líderes religiosos e o cerceamento da liberdade religiosa se multiplicam a cada dia, como um lembrete de que o martírio (palavra grega quase sempre traduzida por “testemunho” no Livro do Apocalipse) e a opressão ainda fazem parte da experiência cristã de muitos. Contudo, é preciso analisar este contexto com olhos atentos, observando as diferentes formas de perseguição que acontecem no cenário global.
A organização Portas Abertas (portasabertas.org.br), que monitora a situação dos cristãos em países onde sua fé é alvo de violência, classifica anualmente os países onde a perseguição religiosa é mais intensa. Entre eles, se destacam países como Coreia do Norte, Afeganistão, Somália, Líbia e Paquistão. Estes lugares são conhecidos pela severidade de suas políticas contra as minorias religiosas, especialmente os cristãos. Na Coreia do Norte, por exemplo, a prática do cristianismo é considerada um ato de traição ao regime, sendo os cristãos forçados a viver em segredo, com risco constante de prisão, tortura e até execução.
No Afeganistão, após a retirada das forças ocidentais, o grupo terrorista Talibã retomou o controle do país, e a vida para os cristãos tornou-se ainda mais insustentável. A conversão do Islã para o cristianismo é vista como um crime passível de morte, e aqueles que escolhem seguir Jesus vivem com o medo constante de serem descobertos. Assim como na Somália e na Líbia, o risco de perseguição não se limita ao âmbito estatal, mas também envolve o perigo da violência de grupos armados ou de militantes religiosos.
A repressão aos cristãos também não é um fenômeno restrito a regiões com governos explicitamente anticristãos. Em muitos países, a perseguição se manifesta por meio da discriminação social, do cerceamento de liberdades e da marginalização das comunidades cristãs. No continente africano, por exemplo, diversos países enfrentam o aumento de ataques de grupos extremistas como o Boko Haram, que assassina e sequestra cristãos em nome de uma jihad violenta. Por outro lado, na Ásia, em países como China e Índia, há um crescente controle sobre a prática do cristianismo, sendo que os fiéis enfrentam pressões para se conformarem às normas estatais e aos valores de maiorias religiosas.
Jesus nos coloca diante de um paradoxo. A perseguição, que é normalmente vista como um mal, é tratada como algo que, por sua relação com a justiça divina, resulta em bênção. Jesus, ao declarar “bem-aventurados os perseguidos”, não está minimizando o sofrimento, mas orientando os seus seguidores a terem uma perspectiva eterna sobre as adversidades. O que parece, à primeira vista, como uma tragédia, é redimido pelo Reino de Deus, que transcende a dor terrena.
Ao longo da história, a Igreja aprendeu a viver com essa realidade. Desde os primeiros mártires até os cristãos perseguidos nos dias de hoje, o sangue dos fiéis tem sido semente para o crescimento do Cristianismo. Perseguidos, mas não derrotados, esses cristãos continuam a dar testemunho de sua fé, enfrentando a dor com esperança, sabendo que, no fim, a vitória será do Senhor.