O profeta Jeremias nos adverte que “o coração é mais enganoso do que todas as coisas, desesperadamente corrupto” (Jr 17.9). Como, pois, algumas pessoas dizem que devemos confiar em nosso coração? É claro que essa é mais uma tentativa humanista do pecado de exaltar o ser humano acima de Deus e de desprezar os sábios conselhos da Palavra do Senhor para dar lugar às ideias humanas. Entretanto, ao lermos em vários lugares das Escrituras, aprendemos que não devemos confiar em nós mesmos, porque “maldito é o homem que confia no homem” (Jr 17.5). É claro que o profeta não quer dizer que não possamos estabelecer relacionamentos confiáveis, como os cônjuges, filhos, ou mesmo em negócios, planos e projetos que fazemos com outros irmãos em Cristo.
O ponto é que não devemos confiar plena e inocentemente no âmago do ser humano, porque nosso ser interior foi totalmente corrompido pelo pecado. Não devemos confiar nem em nós mesmos, porque podemos ser enganados por nosso próprio coração, que é pecaminoso. Não fosse a graça de Deus em Cristo atuando em nós por meio de seu Espírito, cairíamos cem vezes nos mesmos pecados até nos enterrarmos na mais profunda lama de iniquidade e no poço de perdição. É a graça que não nos deixa aprisionados no lamaçal (Sl 40.2). Por isso, o escritor dos Provérbios nos ensina: “Há caminho que ao homem parece direito, mas ao cabo dá em caminhos de morte” (Pv 14.12). Há caminhos que consideramos corretos, mas que nos levam para a morte.
Muitas vezes, insistimos numa estrada. Somos obstinados e contumazes em manter hábitos destruidores sem considerarmos diante da Palavra de Deus que são caminhos de morte. Apenas ouvimos o coração, sem, contudo, observarmos que, se levarmos a cabo aquele projeto, não chegaremos vivos ao final de tudo. Todavia, o pecado nos faz insistir em tudo aquilo que contraria a Palavra de Deus. Preferimos muito mais ouvir a voz de nosso coração a ouvir a Palavra de Cristo. A razão é porque somos obstinados e tendemos a nos afastar de Deus, porque desejamos autonomia. Não queremos ter um senhor sobre nós, porque não queremos dar satisfação a ninguém. Queremos ser donos de nossos próprios narizes e capitães de nossos próprios navios.
Contudo, a Palavra nos diz que o melhor caminho é aquele estabelecido pelo Senhor, porque ele não apenas criou todas as coisas, conhecendo, portanto, cada detalhe de tudo o que existe, como também preserva todas as coisas, ordenando tudo por sua santa providência, a fim de que todas as coisas aconteçam conforme sua determinação e graça. Se ele é o autor e preservador, cabe-nos ouvir o que ele tem a dizer e seguir suas instruções. O desejo de autonomia do ser humano é uma apostasia, porque pretende ser o que ele não é e afastar-se daquele que pode fazer muito mais do que pedimos ou mesmo pensamos.
Se aprendêssemos a depender mais do Senhor, e se dispuséssemos nossos corações para amar mais sua Palavra, certamente usufruiríamos mais de todos os benefícios que ele destina para seus filhos. O problema é que insistimos na falsa liberdade proposta pelo pecado, sugerindo que seremos mais felizes se não tivermos Deus para nos controlar. Acusam-nos de marionetes, de fabricarmos um deus para simplesmente justificar nossos fracassos, de projetarmos ilusões para satisfazer as incógnitas que temos a respeito de nós mesmos e da realidade.
Para o ser humano pecador, é muito mais fácil negar a existência e a interferência de Deus na realidade humana a ter de enfrentá-lo face a face. Porque enfrentar Deus é ter que admitir nossa falência e miséria. É ter que buscar uma resposta real para nossos maiores dilemas, mas ao mesmo tempo enfrentar que essa resposta só pode ser encontrada em Deus, criador e preservador de todas as coisas. O ser humano que milita por autonomia quer se distanciar de Deus e, por isso, não estará disposto a renunciar a si mesmo para acolher que há um Deus que o governa e a quem ele deve obedecer. Ele preferirá dizer: “Ouça seu coração”, para tentar fugir da realidade de um Senhor sobre ele e seus planos. Ele continuará em seu caminho, ainda que ele seja de morte, por orgulho de não ter de aceitar outro Senhor que não seja ele mesmo.
Somos idólatras naturalmente, porque fazemos de nós mesmos ídolos ao erigirmos em nossos tronos nossos desejos mais íntimos e recusarmos a abandoná-los para seguir ao Senhor. O processo de cura conheça quando reconhecemos nossos pecados, nos arrependemos de nosso orgulho e nos inclinamos na presença do verdadeiro e único Senhor, que é Deus. No momento em que passamos a temer o Senhor, entendemos seu propósito para nós e, então, nos curvamos diante de sua presença, dispostos a obedecer aos seus mandamentos. Negamos a nós mesmos para admitir outro Senhor sobre nós. Renunciamos às vozes de nossos corações para ouvirmos somente a voz de Cristo em sua Palavra. Humilhamo-nos na presença de Cristo a fim de sermos exaltados por ele em nossos caminhos.
Soli Deo Gloria!