Ao entrar na adolescência, uma das minhas primeiras vontades revolucionárias típicas da fase foi a de cortar o cabelo. Um corte onde iria embora metade dele e minha cabeça enloirada ganharia, pra completar, um boné de enfeite.
Vale ressaltar que minha mãe nessa época era testemunha de Jeová. Detalhe. O salão escolhido por minha madrinha era como todos que eu já havia frequentado: simples, mulheres fofocando, mães procurando meninos perdidos, telefone chamando, o bar vizinho com o som alto, o barulho do secador se misturando ao som do rádio… coisas comuns de bairro.
Corte feito, vida que segue, e em vários momentos me vi nessa mesma situação. Seja pra fazer a unha, ou pintar o cabelo, enfim. E já errei muito, porque dentro desse contexto, achar um salão com uma boa cabeleireira e pouco recurso financeiro se mostrou uma tarefa bem difícil e foi inclusive o motivo de decidir fazer tudo sozinha em casa. Aquela velha franja torta que toda mulher conhece.
Hoje, aos trinta, elegi o “meu” salão. Escolha pautada na qualidade do serviço oferecido.
A questão é, quando cheguei o estranhamento começou não só pela recepção cordial das atendentes que facilmente poderiam ser modelos (e descobri que eram!!!), muito diferentes das mães, avós e tias do meu bairro. Mas também pela experiência de relaxamento, sossego, sorrisos tímidos, secadores difusos, tudo tranquilo demais. Não fosse a minha presença.
A simples presença de uma pessoa de bairro, qualquer, uma não blogueira, em um salão desses já perturba toda essa solitude imprevisível. O que eu estava fazendo ali? Qual era meu @? Com quem eu tinha parceria???
Mas ninguém falava nada.
Nenhum telefone tocava, nem mesmo uma mãe gritando ao fundo.
E eu obviamente a estranha no ninho, era denunciada a cada ato: não cheguei ao salão arrumada, carregava uma garrafinha de água de plástico e tive a pachorra de não tirar foto de nada…
Ao final, não fiz um pix. Paguei em dinheiro, meu último ato nada condizente com a realidade de 2023 e com aquele salão chiquérrimo (ele tem até uma mesa posta ao centro que me pergunto se em algum momento todos se juntam, funcionários e clientes e vão comer).