Terminar nunca é fácil. Do lado de fora, tudo parece simples: “Encerre esse ciclo”, dizem, com a certeza de quem observa à distância. “Já deu, não tem futuro.” Palavras que ecoam como verdades absolutas quando não somos nós os envolvidos. Mas, quando o peso da decisão recai sobre nossos ombros, a clareza se desfaz, e o que resta é uma teia de apegos, memórias e saudades de um tempo que já não existe.
Há algo quase masoquista na forma como nos agarramos ao que nos machuca. A vaga de emprego, conquistada com tanto esforço, agora parece um castigo diário. As reuniões intermináveis, as metas inalcançáveis, o colega que fala alto demais – tudo isso corrói a entusiasmo de outrora. Ainda assim, na segunda-feira, lá estamos nós, cumprindo o ritual, como se a repetição pudesse, milagrosamente, devolver o brilho perdido.
O mesmo acontece com as relações. Aquela pessoa que, no passado, fazia o coração acelerar e o estômago dançar com borboletas, hoje provoca uma pontada diferente – uma dor que não explica, mas pesa. As conversas, antes fluidas, tornaram-se silêncios constrangedores. Os encontros, que eram refúgio, agora são obrigações. E, no entanto, continuamos lá, presos a um fio de nostalgia, como se a insistência pudesse ressuscitar o que já se foi.
Até os lugares carregam essa carga. O café na esquina, onde tantas risadas ecoaram, agora parece pequeno, abafado, com um cheiro de mofo que você jura não ter notado antes. As pessoas que costumavam te acolher, com suas histórias e brincadeiras, hoje te irritam com os mesmos trejeitos de sempre. Só de pensar em cruzar a porta, o corpo já reclama, mas, na hora marcada, seus pés te levam, quase por inércia.
Por que insistimos? Talvez porque o fim exige coragem – não a coragem heroica dos grandes gestos, mas a silenciosa, que enfrenta o vazio do depois. Terminar é admitir que algo que já foi tudo agora é nada. É encarar o luto de soltar o que, mesmo doloroso, ainda é conhecido. O futuro, com suas promessas incertas, assusta mais do que a dor familiar do presente.
Mas há um momento em que o peso do apego se torna insustentável. É quando a irritação vira exaustão, e a saudade, um eco distante. Nesse instante, percebemos que não é o fim que nos prende, mas o medo de recomeçar. E, talvez, seja aí que reside a verdadeira libertação: no gesto simples, mas monumental, de dizer “chega”. De fechar a porta, entregar a carta de demissão, ou simplesmente não aparecer na hora marcada.
Terminar não é fácil, mas é necessário. Porque, às vezes, é só ao soltar o passado que descobrimos que ainda há espaço para borboletas – aquelas que não doem.