Há alguns anos, participava de uma das mostras realizadas pelo Cinema Comentado Cineclube quando um comentário de um participante me chamou atenção. Na verdade, me irritou. O convidado falava sobre os desafios de produzir Cinema no Brasil, e assim que a pessoa pediu para falar eu soube que não vinha coisa boa. Já conhecia a peça.
O questionamento era a imagem que o Cinema passava do país. Para ela, filmes como Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002), indicado em quatro categorias do Oscar, e Central do Brasil (Walter Salles, 1998) – que rendeu à Fernanda Montenegro a indicação ao Oscar de Melhor Atriz, e a indicação de Melhor Filme Internacional – não nos representavam. Para ela, a moça que pediu espaço para dar sua humilde opinião, era esse o motivo pelo qual o Cinema nacional não era consumido.
Pensando sobre o que escrever na minha estreia como colunista do jornal O NORTE, logo me lembrei do fatídico dia. Porém, o texto não se trata de uma crônica sobre o fato. Quis inaugurar o espaço trazendo à luz um tema pouco lembrado, principalmente pelos que produzem cinema de forma independente: distribuição.
O assunto, claro, é complexo. Aqui, quero explorar um ponto em específico. Em 2023, 161 longas-metragens brasileiros foram lançados. Em 2024, 311. E eu te convido a refletir: quais títulos você assistiu? Aliás, quais você ao menos teve conhecimento do lançamento? O público que conferiu as sessões nacionais não chega a 10% do total.
De 2001 a 2021, existiu uma cota que determinava um número de dias fixos para as salas de cinema exibirem obras nacionais. No ano passado, uma nova Lei, a 14.814/2024, restabeleceu as reservas obrigatórias para elas em sessões de cinema e em canais de televisão paga. É lógico que isso não resolve o problema do acesso, porque não é só o domínio das salas pelas produções internacionais o motivo da disparidade, que também abrange as diferenças regionais de um país que é continental. A dificuldade de acesso ao audiovisual em cidades do interior e regiões periféricas, que deixa muitas produções restritas a festivais ou ao circuito alternativo, também deve ser levada em conta.
Após a pandemia, pudemos acompanhar um aumento nas produções audiovisuais, amadoras ou profissionais, principalmente graças às Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc. Contudo, ainda precisamos de uma evolução quanto à promoção do acesso aos filmes. Muitos filmes nacionais não conseguem competir no mercado devido à falta de recursos para divulgação. Editais específicos para ações de marketing cultural, por exemplo, podem aumentar a visibilidade dessas produções.
Recentemente – para ser mais exata, após o sucesso internacional de “Ainda estou aqui” (Walter Salles, 2024), o Governo Federal anunciou o lançamento da Tela Brasil, uma plataforma de streaming gratuita voltada exclusivamente para a difusão do cinema nacional. Outros streamings gratuitos já existentes e com uma curadoria excelente são, por exemplo, o Itaú Cultural Play e o Sesc Digital.
Porém, somente disponibilizar as produções on-line não adianta para um público que não acredita nas possibilidades do nosso cinema. Acompanhando a repercussão da indicação da atriz Fernanda Torres ao Oscar, e da premiação no Globo de Ouro, fico pensando que o que precisamos é isso. Defender nossa arte. Mas, sobretudo, consumi-la. Se não, todo o esforço é inútil.