Uma grávida acorda de madrugada e atormenta o marido com desejos esdrúxulos como “meu bem, estou com uma vontade de comer jatobá”; pois ontem tive um querer excêntrico: ouvir Wando.
Nascido em Cajuri, Minas Gerais em dois de outubro de 1945, Wanderlei Alves dos Reis, cujo nome artístico era Wando, foi um vulcão dos palcos. Sua discografia vai de 1973 a 2005. Distinguia-se por sensualizar sua apresentação, uma vertente rara até então. Seu magnetismo e carisma atraiam multidões de mulheres aos seus shows, e, em cena, estimulava a histeria das fãs, que jogavam suas calcinhas no artista, após ele mesmo começar a prática em 1990. Era uma forma impudica de provocação. Para continuar no clima erótico-sexualizado, cantava músicas apaixonadas, com ingredientes apimentados que arrancavam faíscas da plateia; era quando se abaixava, pegava a calcinha, a olhava e a levava ao rosto, disseminando um frenesi nas mulheres.
Valorizava e atendia bem ao seu público, seguindo adiante com a representação do seu personagem lascivo, e para isso compunha letras que falavam de amor, de forma romântica, e outras vezes com assédio e objetificação da mulher. Eram os momentos de maior troca com um público cativo e delirante.
Nas entrevistas, deixava-se fotografar entre milhares de calcinhas, expondo seu lado luxurioso que tanto fortalecia seu domínio. Wando ofertava o que as mulheres queriam, e algumas pensavam estar apaixonadas por ele. Hoje é difícil imaginar seu comportamento considerado obsceno, dada a atual patrulha de costumes de gente que se diz conservadora, mas na verdade, quer retroagir aos hábitos de cem anos atrás.
Wando se foi em oito de fevereiro de 2012, aos 66 anos, em Nova Lima – MG, deixando um rico repertório, que convida as mentes românticas ao sonho. Jovens de então viram Wando na televisão, conheceram suas músicas, compraram seus discos, cantaram suas letras, que tocavam o íntimo dos corações apaixonados.
Quem quiser ouvir versos originais, não os encontrará. Sobre amor, sedução e paixão, tudo já foi dito nas formas mais ridículas possíveis, e ouvindo Wando, mesmo se atendo ao seu apuro estético, em várias passagens se sentirá representado. Fazia bem seu serviço.
Vejamos: “Moça” – “Moça/ Dobre as mangas do tempo/ Jogue teu sentimento/ Todo em minhas mãos/ Eu quero me embolar nos teus cabelos/ Abraçar teu corpo inteiro/ Morrer de amor/ de amor me perder”; “Chora coração” – “Um amor quando se vai/ Deixa a marca da paixão/ Feito cio de uma loba/ Feito uivo de um cão/ É feitiço que não sai/ Dilacera o coração/ É um nó que não desmancha/ É viver sem ter razão/ Chora, coração/ Chora, coração/ Passarinho na gaiola/ Feito gente na prisão; e “Fogo e Paixão” – “Quando tão louca/ Me beija na boca/ Me ama no chão/ Me suja de carmim/ Me põe na boca o mel/ Louca de amor/ Me chama de céu”.
Formado em violão clássico, compôs sambas e depois músicas apaixonadas e inesquecíveis. Eis a nudez de Wando, cuja coleção de calcinhas ganhou fama de a maior do mundo. Uma fama justificada pela atração que exercia nas fãs.