Passei pelas folhas e agora chego eu às flores. Tal palavra não tem variados significados quanto folhas, o aparelho respiratório dos vegetais, mas receber flores toca fundo o coração dos mais susceptíveis, pela sua beleza, suavidade, delicadeza e previsível perfume.
Flores bastante significativas chegaram-me de avião, vindas de um lugar distante. Eram rosas colombianas vermelhas gigantescas, as maiores que já vi, belas, frescas, aveludadas, inodoras, formando um buquê, dentro de uma misteriosa caixa de Giuliana Flores, sem indicação externa de onde vinham, envoltas em um invólucro de delicada tela de juta, amarradas com um grande laço. Chegaram de longe, e pretendiam seduzir-me e para tal, contavam com a onipresença de um cartão com versos de Fernando Pessoa e uma assinatura oriunda de passado remoto. Alcançou meus olhos, aquecendo meu espírito. O presente foi um tiro certeiro determinante em minha vida.
Flores ainda mais importantes estavam num vasinho de cerâmica rústica, pequena, com listras brancas infantilmente pintadas. Nele estava plantada uma folhagem singela, com florezinhas brancas, escassas e minúsculas. Tal presente foi-me dado pelo meu filho Fernando, então com quatro anos. Ele deveria estar vestido como os demais colegas com um short branco e uma camiseta vermelha, mas estava de uniforme comum num dia de festa. Eu o levava e buscava na escola todos os dias, e o aviso não me chegou, talvez devido à sua desatenção. Estava sem a roupa da apresentação, uma musiquinha que sua turma cantaria, para então entregar a cada uma das mães a plantinha cultivada. Diferente dos outros, de uniforme e contumaz hiperatividade, ficou trancado sozinho na sala. Quando eu, no local da festa, percebi que sua turma estava sem ele, corri até lá e o encontrei com o rosto inchado de chorar. Ainda assim, me entregou seu presente. Ambos nos abraçamos entre lágrimas. Recebi essas florezinhas num momento tão traumático para nó
s que foi difícil voltar a participar de uma festa escolar.
Muitas outras vezes recebi flores de clientes, amigos e namorados. É presente de grande consideração e, assim como chocolate, traz afeto embutido, com grande simbolismo e significado.
Uma flor nos cabelos é graciosidade; flores em jardins, vasos, buquês, coroas, joias e seus tantos usos e custos agradam aos que as recebem, mesmo sabendo da explosão de preços no Dia dos Namorados e no Dia das Mães.
As flores são os órgãos reprodutores das plantas, e para a frutificação acontecer é necessário que os insetos misturem os pólens, em especial as abelhas.
“A dor vai curar essas lástimas/ O soro tem gosto de lágrimas/ As flores têm cheiro de morte/ A dor vai fechar esses cortes/ Flores/ Flores/ As flores de plástico não morrem” - Titãs. As imortais flores de plástico remetem à estética de cemitério.
Você gosta de flores? Todos gostam, até os bichinhos. Não vê as abelhas? Mas quem as ganham em grande quantidade são os mortos. Mais um complemento triste, porque já não as podem ver, sentir sua textura nem seu perfume.