Mara Narciso

Lacrou!

Publicado em 31/01/2023 às 06:23.

O professor Elias Santana do Gran Cursos Online explica: “lacrar” é realizar algo com sucesso, fazer bem feito, arrasar; é fazer algo tão bom que cala os críticos, deixando-os sem argumentos.

Não costumo usar gírias, mas aqui a analogia se faz necessária. O engenheiro, palestrante, jornalista, jazzista, psicodramaticista, artista plástico e escritor de literatura e livros técnicos de eletricidade política Paulo Ludmer obrigou-me a consultar o Google para classificar sua produção. Trata-se do seu mais recente livro de contos “Lacres, laços e suspiros” encontrado na Editora Reformatório, Amazon e livrarias.

Escrito na primeira pessoa, toma a forma de gente ou objeto para contar miudezas com dramaticidade e zelo. Dono das palavras, economiza-as. Tem usura da sua posse, mas é magnânimo em doar ideias. Cada frase deve ser lida em voz alta e repetida para não escapar nada que chega. Em quatro palavras pode estar a história de uma vida.

A atenção estrita é importante porque a questão temporal pode mudar de um parágrafo ao outro. Décadas avançam ou recuam. Pitadas filosóficas são gotejadas, mostrando-se o autor um observador que, de fora da cena, numa teclada pode acabar com a festa. Sinuoso, pega minúcias que costumam ser consideradas preocupações femininas, sendo aqui visões de vida desapontadoras. Em certo momento, o êxtase está prestes a acontecer, a boca está cheia, a mastigação está no fim, e, ao invés de engolir, o personagem é ordenado a cuspir. Nada a reclamar. Vidas lotadas de desventuras estão em todos os lugares.

Haja cantos no mundo para o autor visitar e jogar sua trama lá. Dia desses fez um poema para Botumirim, e agora cita Montes Claros duas vezes. Conhece tudo porque palmilhou o mundo, fala vários idiomas, e por isso pode colocar palavras em qualquer língua.

Ler cada conto é conhecer os desejos humanos nobres até os mais mesquinhos, podendo ir de emoções ao interior da terra, quando, após comer uma pizza, o personagem pensa: “suas farinhas viajaram pelas nervuras da terra, agora nas minhas entranhas”.

O leitor enfeitiçado pelo seu tutor que tudo pode, caminha. A proximidade é magicamente conseguida até através do nome dos dedos: mindinho e fura-bolo. Para que usar dedo mínimo e indicador se se pode falar ao ouvido da infância e levar o incauto às desilusões? Sim, alguns desejos ficam no quase.

O gostar muito leva ao exagero de fã, uma curiosa que nada sabe de crítica literária, e acaba sendo levada pelo afeto. Veja uma frase que coloquei no Facebook: “desde que me descobriu, dedicou-se a me dar seu mundo” PL. Frase de gênio não se explica, mas ouso fazer isso: namoramos alguém e contamos preciosidades que nos fizeram ser o que somos, o tesouro dos nossos melhores momentos, as esquinas da vida, as decisões e o outro recebe a folha dessa vida com desdém, a embola e a joga no lixo. Muitos viveram coisas assim, por isso “Lacres, laços e suspiros” de Paulo Ludmer pega a todos pelos pés e pelas mãos. E especialmente pelo lado erótico do cérebro.

Compartilhar
Logotipo O NorteLogotipo O Norte
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por