Mara Narciso

A internet e os debates

Publicado em 23/01/2023 às 23:46.

Durante os 23 anos em que uso as redes sociais, desde uma época em que não tinha esse nome – inadequado, a meu ver, já que incentivam o comportamento antissocial através do ódio e da violência –, vejo as conversas se transformarem em debates hostis.

Ao fazer uma postagem habitual em que a maioria parece pensar de forma semelhante, vem logo a divergência. Quem a provoca, em geral, com ataques desonestos, vem armado para o combate. Não há um meio termo, uma maneira de concordar em parte e explicar o que pensa diferente, há um partir para cima, mirando os olhos para enfiar o dedo e o estômago para desferir um soco. A voracidade sanguinária não é contra a ideia e, sim, contra quem a mostrou.

Em quase sua totalidade, quando faço uma postagem abordando um tema com previsíveis posições antagônicas, preparo-me para não me manifestar, em especial para quem apoia meu ponto de vista, porque sei que os ataques contraditórios serão ferozes. Também posso mostrar os dois lados de um mesmo tema, porém, optando por um lado.

Na vida real, nunca me omiti e sempre me mostrei, deixando demarcada a posição em que estou, mesmo quando meu oponente era quem pagava minha comida. Ainda assim, nas redes fui referida como pusilânime.

Na internet de 2005, na “Comunidade Espancadores de Teclados” do Orkut, opinei e fui linchada. Todos do grupo ficaram contra mim, armados com facas para me escalpelar. Eu sugeri, debaixo de um texto, que a autora fosse hiperativa. Apanhei. Desde então, não rebato na internet. Quando contrapõem o que acabei de dizer, calo-me, por achar melhor fugir do confronto, evitando a discussão. Não preciso convencer as pessoas acerca das minhas bandeiras. Enquanto isso, vou soltando um pedacinho delas aqui, outro acolá.

Falei da vinda de Lula a Montes Claros em 27 de outubro, dia do seu aniversário de 2017. O Brasil já estava dividido. Assim, fui elogiada e atacada, meio a meio. Fiz uma matéria jornalística, citando atitudes de apoiadores e de opositores ao atual presidente. Foram muitos comentários e compartilhamentos. Não fiz nem uma tréplica. Quando o movimento cessou, escrevi que não havia respondido aos ataques, porque o texto expressava o suficiente. No dia 7 de abril de 2018, Lula entregou-se à Polícia Federal.

Conhecer pontos de vista diferentes amplia o pensamento de mentes não obscuras. Porém, atacar nas redes tem efeito oposto.

Expressiva maioria de brasileiros mostra-se contrária aos atos terroristas em Brasília, impetrados por extremistas de direita. Porém, na internet, ser contra o terror gera agressões verbais. Quando alguém retruca, cinco coisas ficam claras: há espaço, plateia, palanque, microfone e holofote para o oponente. E com isso ele cresce. Ao não responder, o silêncio é uma resposta – e quem fala por último nem sempre fala melhor.

Não gasto um mísero segundo remoendo uma fala contundente. Os meus 21 anos de psicanálise lacaniana com a psiquiatra Consuelo Guedes Meira, deram-me ferramentas psíquicas para não valorizar narrativas delirantes.

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