Gosto de transformar conversas em textos verbalizados, aqueles que outras pessoas podem ler e, de certa forma, participar. Tinha um conhecido que odiava esse meu hábito — tanto que acabou virando uma crônica bonita. Não posso revelar seu nome, essa vigésima terceira letra incógnita do meu alfabeto amoroso.
Essa semana, numa dessas conversas que viram texto, tentei argumentar para um paquera que a amizade é tão importante quanto o amor nas relações. Confesso: o pensamento não é meu. É da Marisa Orth, num episódio do Saia Justa. Ela disse que “a amizade é um sentimento que legitima todos os outros”. Explico melhor: se você não for amigo de quem ama, o amor desmorona. Porque o amor, apesar de todo seu encanto, é frágil. Parece uma flor complicada de cuidar, dessas que florescem no escuro de vez em quando, mas murcham fácil sob o sol. É a amizade que sustenta. É o esteio, a laje, a base de concreto. A pedra angular que mantém o amor de pé.
Se a paixão tem a função de arar a terra para que o amor germine, a amizade ergue paredes sólidas para que, como diria Octavio Paz, “a chama dupla do amor” não se apague. A amizade é a embalagem que protege todos os outros sentimentos, dizia Marisa. E eu concordo.
Não estou dizendo que amigos se beijam — não acho que seja o caso. Mas acredito que amantes precisam ser amigos, talvez antes, talvez depois. É a amizade que cria a intimidade para lidar com as dores da vida: conversar de madrugada sobre o que incomoda, rir dos conhecidos chatos, desabafar as farpas invisíveis que arranham por dentro, revisitar os sonhos perdidos pelo caminho, confessar os amores que ficaram pelo passado.
Ficar com amigo é uma coisa. Ter amizade com quem você fica, namora ou casa é outra bem diferente — e muito mais profunda. Sempre achei que, no fim das contas, é a amizade que segura as pontas. O amor pode ser sublime, mas quando o encanto vacila, é a amizade que impede a queda.