Não adianta falar com eles. Aliás, acredito que um monólogo sempre será mais produtivo do que qualquer diálogo com aqueles tais. E o pior: sempre tem um perto da gente. Sempre com uma desinformação a mão: vacinas que causam mutações, microchips implantados a força, guisado de cachorro e gato ao molho barbecue em alguns lugares, ditaduras queers, cristofobia, remédios que não curam o que supostamente prometem... a lista é enorme e, infelizmente, extensiva.
Aqueles tais não se comovem com a verdade, mesmo que ela esteja escancarada na cara deles. O que me lembra a parábola da Verdade e o Poço. Sem saber que se tratava da Mentira, a Verdade aceita se banhar em um poço e deixa suas roupas em um canto do local. Esperta e sorrateira, a Mentira pega as vestes da Verdade e sai peregrinando pelos cantos, enganando as pessoas fingindo ser quem não é. Por sua vez, a Verdade não aceita usar as roupas da Mentira e passa a vagar nua, sendo repelida por todos. A cena é o retrato atual: nua, a verdade incomoda e causa repulsa, enquanto a mentira agrada e é conveniente.
Geralmente, aqueles tais amam caridade, mas não gostam de justiça social, porque é melhor para o equilíbrio social deles que pobres existam. Afinal, ajudar os pobres é algo lindo e que garante suas passagens para o paraíso. Outra coisa que caracteriza essa gente: sua estética. Amam ostentar uma brasilidade cafona, forçada e exaustiva – verde e amarelo até mesmo nos dentes, nos batons, nos cílios, em suas bíblias e, se fosse possível, também colocariam em suas armas. As balas verde-amarelas arrancam sangue vermelho comunista!
Sabe, aqueles tais, eu até entendo vocês: deve ser muito doloroso ver ruir cada privilégio conquistado a força durante as décadas. Ver cada pedacinho que caracteriza vocês ser tomado e, o melhor, ressignificado. Apesar de tudo estar incerto, vocês cometeram um crime inafiançável: usurpar os sonhos alheios. Se é verdade que a própria verdade mora num poço, é para lá que vocês deverão ir – presos com ela, nutridos de limo e lodo, ouvirão suas palavras ecoarem por toda a eternidade. Ou até que aprendam a distinguir que Verdade e Mentira, apesar de terem suas roupas trocadas, jamais serão as mesmas.