Pedro MartinsEscritor, Ciências Jurídicas e Agronômicas

Saindo pelos fundos

Publicado em 05/07/2022 às 22:56.

Entra, caminha até a catraca, é recepcionado, e sai pelos fundos. Incessante rota de descaso. Essa é a hospitalidade das casas ambulantes. As lotações têm essa característica, de buscar o Juquinha, a Dona Maria e Seu Zé em seus respectivos pontos. Recepcioná-los pela porta da frente e despachá-los na porta dos fundos. Esse é o hábito dos “busões”.

Imaginemos cenas análogas. Medusa é recepcionada por amigos que a recebem pela porta da frente. Viajam em devaneios próprios de uma conversa dinâmica, param em vários pontos de convergência e divergência de ideias, até que em dado momento, como se a Medusa estivesse esperando por um destino final, é levada até as portas dos fundos. De duas uma, ou as duas: Medusa é uma péssima pessoa e não saiu pela porta da frente, ou quem a recebeu foi descortês por não a levar à porta da frente.

Outra cena: Romeu sempre comparecia na casa da Julieta nas noites em que o esposo da Julieta trabalhava para arrecadar fundos de subsistência familiar. Ao sair pela madrugada, deveria sair pela porta dos fundos, afinal, não poderia deixar que descobrissem o concubinato existente. A traição deve ser velada, caso contrário, perde seu sentido clichê de existir. 

E as pessoas públicas, que se escondem sob vestes de falso sincretismo das necessidades de todos, que visando sempre suas próprias concepções fazem com que, no plano dos fatos, todos acreditem que está em consonância com as necessidades que poderiam suprir, mas quando inquiridos pela opinião pública, se escondem em vestimentas de tecnocratas.

Somos, todos nós, que andam de ônibus pelas cidades, convidados irritantes, fura-olhos ou injustos? Entramos pela frente dos ônibus, saímos pelos fundos. Isso seria fruto da ornamentação física do espaço do ônibus para trazer eficiência? Obviamente que sim.

Mas, metaforicamente, a verdade é que sair pelos fundos, na hipótese de quem frequenta lotações, é na verdade o status social de quem engrandece a luta pelos próprios objetivos, são guerreiros de cruzada, que no cotidiano urbanístico garantem a redução do tráfego do trânsito, dos danos à ecologia e, principalmente, a vida em fraternidade. 

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