Caboclo, cabrocha, cafuso, híbrido, mameluco, mesclado, mestiço, mulato, nhapango, pardo

Jornal O Norte
27/05/2009 às 10:18.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:00

Felippe Prates

“Brasil, meu Brasil brasileiro/meu mulato inzoneiro”, décadas depois de Ary Barroso cantar em seus versos um Brasil em que o congraçamento dava o tom, a mestiçagem encontra-se sob suspeita.  O Estatuto da Igualdade Racial, prestes a ser votado na Câmara em meio a discussões acirradas,  reserva quotas para afro-brasileiros, mas não menciona caboclos, cafusos, mamelucos ou mulatos.  “Trata-se de uma ficção bicolor”, dizem os seus críticos.  O reconhecimento de uma divisão social que o “mulato inzoneiro” apenas encobria, reclamam seus defensores.  Artistas e pesquisadores procuram novos matizes nessa discussão polarizada.

O compositor Jorge Mautner atualiza a utopia da mistura étnica brasileira num Manifesto Amalgamista e o escritor Marcelino Freire explora as ambiguidades da questão no conto “Precisa-se”: ( ...”O que eu sou, assim no espelho?  Coloque aí, escreva:  mestiça, isso aí, doméstica mestiça.  Pode anotar.  Só não pode é contar para ninguém, tá?...). Na mistura geral de texto e imagem, indagamos que lugar a mestiçagem ocupou historicamente na cultura brasileira e que sentido pode ter até hoje.

No começo do século XX boa parte da elite política brasileira achava que a única solução para o nosso país era o branqueamento da população, numa época de prestígio das ideias do diplomata francês Arthur de Gobineau, que considerava a mestiçagem uma degeneração.  “A valorização da mestiçagem como marca e força do Brasil, surge nos anos 1920 e 1930, em resposta a uma elite eurocêntrica que negava até a possibilidade de um país ser viável nos trópicos”, segundo o crítico de arte Paulo Sérgio Duarte.

Coitado do Gobineau!  Deve estar corcoveando na sepultura ao constatar que menos de um século depois Barack Obama, um negro, um mulatíssimo dos lábios roxos é Presidente dos Estados Unidos da América!  “Sou um mulato nato, no sentido lato./  Mulato democrático e liberal!”  Repetindo como um mantra afro os versos de “Sugar Cane Fields Forever”, assim Caetano Veloso saudou no “show Obra em Progresso”, a eleição de Obama à presidência dos EUA.  “Obama se definiu como um mulato e disso se orgulha”, discursou o grande artista baiano.  “Ele quer imitar os brasileiros e muitos brasileiros querem imitar os EUA de Obama”, arrematou.

“Numa coincidência de violência e amor, o Brasil é o inferno dos pretos, o purgatório dos brancos e o paraíso dos mulatos”.  A frase é do jesuita italiano André João Antonil, publicada em 1711 em seu clássico “Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas”, num atestado de quanto o Brasil da época já era uma sociedade miscegenada.  A mestiçagem começa em nosso país com o desembarque dos portuguêses, diz o historador Alberto da Costa e Silva, autor de “A África explicada aos meus filhos” (Agir).  “O Brasil não era uma colônia de povoamento, como os Estados Unidos e, por isso, vinham para cá muito mais imigrantes homens do que mulheres”, diz ele.

A violência sexual foi um marco da relação dos senhores com suas escravas, mas em maior escala a mistura se deu por uniões consensuais entre índios, negros alforriados e brancos pobres:  “A miscegenação popular que continua até hoje”, garante o historiador.

Referência:  Jornal “O Globo”.


_____________________


Falem-nos:  felippeprates@ig.com.br

Compartilhar
Logotipo O NorteLogotipo O Norte
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por